Anestesia Espiritual

A palavra anestesia tem sua origem no vocábulo grego e significa “ausência de sensações”. Popularmente, podemos dizer que é um estado em que a sensibilidade fica temporariamente bloqueada. Muitos pacientes, ao serem submetidos a algum procedimento cirúrgico, são anestesiados para não sentirem nenhuma espécie de dor.

Infelizmente, nossa sociedade passa por um processo de anestesia espiritual. Fomos anestesiados em relação à dor de quem sofre. Para não sentirmos a dor que os outros sentem, anestesiamo-nos e, assim, divorciamo-nos da solidariedade. Se em tempos distantes a preocupação com o vizinho doente era prioridade, hoje esta atitude parece não mais condizer com o homem pós-moderno. A pós-modernidade enclausurou o ser humano em suas próprias preocupações e tem lhe roubado o direito de amar.

Muitos caminham pela vida anestesiados em relação à dor de seus irmãos e irmãs. No tempo de Jesus não era diferente. Os fariseus e escribas olhavam para os doentes e sofredores e enxergavam somente a impureza. Estavam anestesiados pela arrogância de suas próprias autossuficiências. A anestesia que impedia a verdadeira solidariedade de acontecer atravessou milênios e chegou até nossos dias com uma nova roupagem, mas carregando em si mesma o mesmo veneno: a falta de amor verdadeiro.


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Jesus trouxe o antídoto contra a anestesia que impedia o ser humano de olhar para o outro e não se compadecer com a dor. Ele nos trouxe o amor como remédio para curar a insensibilidade que roubava do ser humano a solidariedade profunda e verdadeira. Se para os fariseus o doente era um impuro, excluído da graça de Deus e da comunidade, para Jesus este mesmo doente era um Filho do Pai que necessitava de cuidados e carinhos. Com o bálsamo do amor, Jesus foi ao encontro daqueles que caminhavam pela vida sozinhos e desamparados. Enquanto alguns feriam os doentes com a falta de compaixão, Jesus os curava com Seu amor sem limites.

Aquele que sofre não é um estranho, mas irmão, filho do mesmo Pai que merece cuidados, amor e carinho. A anestesia espiritual nos afasta da verdadeira solidariedade. Enquanto a teoria roubar a cena, correremos o risco de nos perder em palavras bonitas e deixarmos sofrendo aquele que clama por nossa presença verdadeira e solidária. Jesus fez a diferença na vida de cegos, leprosos e pecadores. Sua atitude mostrava a cada fariseu ou escriba que eles somente seriam verdadeiramente humanos se, antes, tomassem o antídoto do amor que os libertaria da anestesia que lhes impedia de ver além de suas próprias verdades.

Cada dia é sempre uma nova oportunidade de fazermos a diferença na vida de alguém. A verdadeira solidariedade nos liberta da anestesia da falta de amor e nos faz ir ao encontro de quem sofre e lhe dizer: “O que posso fazer para ajudá-lo?”; “Estou junto com você!”; “Juntos vamos encontrar uma solução!”; “Se precisar de mim, pode me ligar ou me procurar a qualquer hora do dia ou da noite!”… Amor verdadeiro não sobrevive de teorias, mas sim de gestos concretos.

Jesus nos ensina, com seus exemplos, a sermos sempre o diferencial na vida de quem sofre e não tem ninguém ao seu lado. Se o antídoto do amor nos libertar da anestesia que nos impede de nos aproximarmos de quem sofre, teremos compreendido o que Ele nos ensinou quando disse: “Não existe amor maior do que dar a vida pelos amigos” (Jo 15,13).