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A alegria do perdão: uma nova vida em Cristo

Aprofundando no assunto:

Até aqui, nós entendemos que o pecado é uma ofensa a Deus, e somente Ele pode perdoar-nos! Jesus, que é Deus bendito, tem o poder perdoar os pecados: “O Filho do homem tem o poder de perdoar os pecados sobre a terra” (Mc 2,10). Este poder, ele concedeu à Igreja, para  que o exerça em seu nome: “Tudo isso vem de Deus, que nos reconciliou consigo por Cristo e nos confiou o ministério da reconciliação” (2Cor 5,18); “O que ligares na terra será ligado no céu, e o que desligares na terra será desligado nos céus” (Mt 16,19); “Em verdade vos digo: tudo quanto ligardes na terra será ligado no céu, e tudo quanto desligardes na terra será desligado no céu” (Mt 18,18).

As passagens são claras:

O Cristo, único que pode perdoar os pecados, deu à sua Igreja o poder de perdoar os pecados em seu nome! Ligar e desligar significa, na linguagem rabínica do tempo de Jesus, excluir da comunhão com Deus e com a comunidade (= ligar/atar) e acolher novamente na comunhão com Deus e a Igreja (= desligar/desatar). Vale a pena, ainda, citar Jo 20,22s: “Recebei o Espírito Santo. Aqueles a quem perdoardes os pecados, ser-lhes-ão perdoados; aqueles aos quais retiverdes, ser-lhes-ão retidos”.  Na potência do Espírito do Cristo ressuscitado, a Igreja continua a obra do Senhor Jesus de perdoar, em seu nome, os pecados. A Igreja não somente pode perdoar os pecados, como também pode retê-los (= não os perdoar). Aparece, portanto, com clareza, que a Igreja recebeu esta autoridade por parte do próprio Cristo.

O Papa Francisco dedicou uma série de catequeses e, especificamente, o Santo Padre, tratou do perdão:

Hoje, completamos a catequese sobre o quinto pedido do “Pai-Nosso”, analisando a expressão «assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido» (Mt 6, 12). Vimos que é próprio do homem ser devedor diante de Deus: d’Ele recebemos tudo, em termos de natureza e de graça. A nossa vida não só foi querida, mas foi amada por Deus. Deveras não há espaço para a presunção quando juntamos as mãos para rezar. Não existem na Igreja “self made man”, homens que se fizeram sozinhos. Todos somos devedores para com Deus e para com tantas pessoas que nos proporcionaram condições de vida favoráveis. A nossa identidade constrói-se a partir do bem recebido. O primeiro é a vida.

Quem reza aprende a dizer “obrigado”. E nós, muitas vezes, esquecemo-nos de dizer “obrigado”. Somos egoístas. Quem reza aprende a dizer “obrigado” e pede a Deus para ser benévolo com o próximo. Por muito que nos esforcemos, permanece sempre uma dívida impagável diante de Deus, que nunca poderemos restituir: Ele nos ama infinitamente mais de quanto nós o amamos. E depois, por muito que nos empenhemos para viver segundo os ensinamentos cristãos, na nossa vida haverá sempre alguma coisa da qual pedir perdão: pensemos nos dias passados na preguiça, nos momentos em que o rancor invadiu o nosso coração e assim por diante… São estas experiências, infelizmente não raras, que nos fazem implorar: “Senhor, Pai, perdoai-nos os nossos pecados”. Deste modo pedimos perdão a Deus.

Pensando bem, a invocação podia até limitar-se a esta primeira parte; teria sido bela

Ao contrário, Jesus liquida-a com uma segunda expressão, que é um todo com a primeira. A relação de benevolência vertical por parte de Deus desvia-se e é chamada a traduzir-se numa relação nova que vivemos com os nossos irmãos: uma relação horizontal. O Deus bom convida-nos a sermos todos bondosos. As duas partes da invocação ligam-se com uma conjunção impiedosa: pedimos ao Senhor que perdoe os nossos pecados, as nossas faltas, “como” nós perdoamos aos nossos amigos, às pessoas que vivem conosco, aos nossos vizinhos, a quem nos fez alguma coisa desagradável.

Cada cristão sabe que existe para ele o perdão dos pecados, isso todos o sabemos: Deus perdoa tudo e perdoa sempre. Quando Jesus conta aos Seus discípulos o rosto de Deus, esboça-o com expressões de terna misericórdia. Diz que há mais alegria no céu por um pecador que se arrepende, do que por uma multidão de justos que não precisam de conversão (cf. Lc 15, 7-10). Nos Evangelhos, nada deixa suspeitar que Deus não perdoa os pecados de quem está bem disposto e pede para ser reabraçado.

Mas a graça de Deus, tão abundante, é sempre exigente

Quem recebeu muito deve aprender a dar muito e a não reter só para si aquilo que recebeu. Quem recebeu muito deve aprender a dar muito. Não é ocasional que o Evangelho de Mateus, logo depois de ter oferecido o texto do “Pai-Nosso”, entre as sete expressões usadas, frise precisamente a do perdão fraterno: «Porque, se perdoardes aos homens as suas ofensas, também o vosso Pai celeste vos perdoará a vós. Se, porém, não perdoardes aos homens as suas ofensas, também o vosso Pai não vos perdoará as vossas» (Mt 6,14-15). Mas isto é forte! Eu penso: algumas vezes, ouvi quem disse: “Nunca perdoarei aquela pessoa! Nunca perdoarei o que me fez!”. Mas se tu não perdoares, Deus nunca te perdoará. Fechas a porta. Pensemos se nós somos capazes de perdoar ou se não perdoamos. Um sacerdote, quando eu estava na outra diocese, contou-me angustiado que tinha ido conferir os últimos sacramentos a uma idosa que estava em ponto de morte. A pobre senhora não conseguia falar. E o sacerdote disse: “Senhora, arrepende-se dos pecados?”. A senhora acenou que sim; não os podia confessar, mas acenou que sim. É suficiente. E depois ainda: “A senhora perdoa os demais?”. E a senhora, em ponto de morte, acenou que não. O sacerdote ficou angustiado. Se tu não perdoares, Deus não te perdoará. Pensemos se nós cristãos, aqui, perdoamos, se somos capazes de perdoar. “Padre, eu não consigo, porque aquela gente fez-me tantas”. “Mas se tu não conseguires, pede ao Senhor que te conceda a força para conseguires: Senhor, ajuda-me a perdoar. Encontramos aqui a ligação entre o amor a Deus e o amor ao próximo. Amor chama amor, perdão chama perdão. Ainda em Mateus, encontramos outra parábola muito intensa dedicada ao perdão fraterno (cf. 18, 21-35). Ouçamo-la.

Havia um servo que tinha contraído uma dívida enorme com o seu rei:

Dez mil talentos! Uma quantia impossível de restituir; não sei quanto seria hoje, mas centenas de milhões. Mas aconteceu o milagre, e aquele servo não obtém um prazo mais longo para pagar, mas o perdão total. Uma graça inesperada! Mas eis que precisamente aquele servo, logo a seguir, se volta contra um seu irmão que lhe deve cem denários — pouca coisa — e, mesmo sendo esta uma quantia acessível, não aceita desculpas nem súplicas. Por isso, no final, o dono chama-o e condena-o. Pois se não te esforças por perdoar, não serás perdoado; se não te esforças por amar, também não serás amado.

Jesus insere, nas relações humanas, a força do perdão. Na vida, nem tudo se resolve com a justiça. Não. Sobretudo onde se deve pôr um limite ao mal, alguém tem que amar além do devido, para recomeçar uma história de graça. O mal conhece as suas vinganças, e se ele não for interrompido, corre o risco de se alastrar sufocando o mundo inteiro.

Jesus substitui a lei de talião — o que me fizeste, eu restituo-te — com a lei do amor: aquilo que Deus fez a mim, eu restituo-o a ti! Pensemos hoje, nesta semana de Páscoa tão bonita, se eu sou capaz de perdoar. E se não me sentir capaz, devo pedir ao Senhor que me conceda a graça de perdoar, pois saber perdoar é uma graça.

Deus concede a cada cristão a graça de escrever uma história de bem na vida dos seus irmãos, especialmente daqueles que fizeram algo desagradável e errado. Com uma palavra, um abraço, um sorriso, podemos transmitir aos outros aquilo que recebemos de mais precioso. Qual é a coisa preciosa que recebemos? O perdão, que devemos ser capazes de dar também aos demais.

Quem é perdoado acaba perdoando

Quem é “misericordiado” é misericórdia para os outros, parafraseando o Papa Francisco. Nós, uma vez perdoados, somos também pontes de reconciliação. Começamos a sentir compaixão porque Ele sentiu por nós e nos perdoou. O perdão produz em nós grande alegria. “A alegria do Evangelho enche o coração e a vida inteira daqueles que se encontram com Jesus” (Evangelli Gaudium, 1). Essa alegria ocorre mediante a misericórdia divina, que, apesar de nossas faltas, não cansa de nos perdoar!
Por fim, imitemos o Cristo! Que perdoou os seus algozes no ápice da dor. Ele foi livre para interceder em favor deles junto ao Pai e pedir o perdão: “Este é o coração de Deus, perdoa sempre porque Deus é compassivo. Não nos esqueçamos de como é a maneira de Deus: Deus é próximo, compassivo e terno, este é o modo de ser de Deus.” (Papa Francisco, 17 setembro de 2013)

Se ainda desejar se aprofundar, deixarei alguns links para que você medite sobre o “ser perdoado”:

Perdoar para ser perdoado (6 de março de 2018); 
O perdão é uma condição para ser perdoado por Deus;
O perdão é um caminho para redescobrir a beleza do Batismo;
Carta Apostólica: Misericordia  et misera.

Guilherme Razuk – Seminarista da Comunidade Canção Nova