«O que lhe falta para se sentir realizado e feliz em sua vida, em seu casamento, em sua pro-fissão?» A pergunta tem sentido, pois só vale a pena viver se nos sentimos gratificados com o que somos e realizamos.
Pelo que tudo indica, para a maioria das pessoas, a resposta não é sempre alvissareira, pela sensação de carência afetiva que as leva a tentar preencher, de todos os modos, o vazio e-xistencial que as acompanha ao longo da vida, deixando-as angustiadas e ansiosas. Um vazio existencial, fruto da própria natureza humana, limitada e precária, que afeta o incons-ciente e a afetividade, gerando sentimentos ou complexos de inferioridade.
Não há como fugir: nascemos pequenos e dependentes, o que nos leva a buscar nossa reali-zação e felicidade em algo que nos torne grandes e importantes aos nossos próprios olhos. Quando não há maturidade e discernimento, o que se costuma fazer é alimentar uma confi-ança, às vezes doentia e obsessiva, na carreira que se abraça, no corpo que se cultiva, no estudo que se faz, no carro que se compra, na casa que se constrói. E quando pouco ou nada se consegue ou quando nada mais nos satisfaz , procura-se refúgio em compensações e cai-se na depressão.
A tentação, então, é fugir de tudo o que importa sacrifício, renúncia e sofrimento. Cria-se um círculo vicioso de conseqüências desastrosas, já que a quase totalidade dos males que afligem a sociedade deriva exatamente do domínio do instinto sobre o espírito, da emoção sobre a razão. Neste processo de involução, à medida que cresce a insatisfação interior, passa-se a procurar culpados, que são sempre os outros: a sociedade, o governo, os pais, a escola, ou, então, a natureza, uma madrasta que nos cobriu de limitações e deficiências.
Mas, «para os que amam a Deus, tudo concorre para o seu bem» (Rm 8,28). Tudo, não ape-nas os bens espirituais, culturais e materiais os quais, não poucas vezes, pelo egoísmo e covardia de quem os recebe, nem sempre colaboram para o seu crescimento, mas até mes-mo a própria fraqueza humana. Foi a grande descoberta feita por São Paulo, que revolucio-nou a sua vida. Esmagado pela humilhação causada por um «enviado de Satanás que me esbofeteava, por três vezes pedi ao Senhor que o afastasse de mim. Ele me respondeu: Basta-te a minha graça: a força se realiza na fraqueza. Portanto, com muito gosto me or-gulharei de minhas fraquezas, para que se manifeste em mim o poder de Cristo. Por isso, alegro-me com as fraquezas, os desprezos, as necessidades, as perseguições e as angústias por Cristo. Pois, quando sou fraco, então é que sou forte» (2Cor 12,710).
Se alguém se lança nos braços de Deus, passa pelo mesmo processo que se verifica em seu corpo: quando os olhos perdem a visão, os ouvidos reforçam a audição; se um pulmão é extirpado, o outro redobra a atividade. É o que acontece com inúmeros santos que, graças às limitações e deficiências que carregam em seus ombros, põem toda a sua confiança no poder e no amor de Deus. E vencem de uma forma extraordinária, infinitamente mais do que seus colegas superdotados. É o caso de São João Maria Vianney. Ele tinha todas as condições para acabar derrotado: pouca cultura, inteligência medíocre, falta de cultivo soci-al, início retardado dos estudos, últimas colocações no seminário, dificuldade de assimilar conhecimentos teóricos, aprovado todos os anos por favor, ordenado por favor e, por favor nomeado para uma paróquia que nenhum outro sacerdote aceitaria. Mas, o que lhe era fra-queza, acabou sendo a sua grandeza, a sua força, a sua vitória.
A alegria de Deus, que conhece nossas fraquezas, sobretudo aquelas de que nos envergo-nhamos e procuramos ocultar, é realizar sua obra-prima exatamente onde nenhum outro investiria. Ao invés de se afastar, é atraído por nossa pequenez mesclada de confiança e de humildade. É a maravilhosa experiência feita pelo salmista: «Teu amor me faz pular de alegria, pois conheces minhas aflições e as angústias de minha alma» (Sl 31,8). O abismo de nossa miséria atrai o abismo da misericórdia de Deus (Cf. Sl 42,7).
Não há nenhum motivo para nos assustar ou queixar diante das limitações, fraquezas e de-ficiências… se nos colocarmos confiantes nas mãos de Deus, dispostos a fazer, momento por momento, a sua vontade, mesmo quando ele permite a dor. Se assim agirmos, elas pas-sam a fazer parte do maravilhoso plano que Deus tem a nosso respeito. Quem faz sua a morte e a ressurreição de Jesus, em todo sofrimento encontra a vida e, em todo fracasso, a vitória.
Foi esse o segredo que revolucionou a vida de Santo Agostinho, e que o levou a bradar: «Ó feliz culpa de Adão e Eva, que nos mereceu tão grande Redentor!»