Introdução
Desde quarta feira de cinzas pusemo-nos a caminho da Páscoa. A Palavra de Deus vai iluminar o caminho que começamos a trilhar, essa Palavra, diz o salmista é «a luz dos nossos passos», ela vai colocar-nos na intimidade com o Pai que está nos Céus.
No meio das múltiplas preocupações quotidianas nem sempre é fácil colocar Deus no centro da nossa vida. Mas temos necessidade de reavivar a graça do nosso batismo, de saborear a alegria de sentirmo-nos amados por Deus, perdoados dos nossos pecados, salvos pelo seu amor. No princípio da quaresma rezamos com o salmista (Sl. 50, 4) «Dá-me a alegria de ser salvo». Este artigo esta dividida em 4 partes:
As tentações
1 – A quaresma começa sempre por apresentar-nos no primeiro domingo as tentações de Jesus. Trata-se de uma situação que se repete em cada homem e principalmente no crente. As tentações de Cristo recordam-nos que seremos sempre tentados a afastar o plano de Deus em nossa vida. Jesus venceu as provas a que foi sujeito; no deserto, no tempo de Moisés, os antepassados de Jesus sofreram as mesmas tentações mas foram vencidos. Mais ainda, já no princípio, o primeiro par humano, Adão e Eva, também foram tentados e ficaram sujeitos ao demônio, o inimigo da humanidade.
Cada um de nós tem uma vocação e missão a cumprir. A vida não é um jogo, nem um peso, mas um dever que temos de afrontar com responsabilidade e coragem, para chegarmos à meta e receber a recompensa. Para isso precisamos de ter os olhos abertos. Quando Adão e Eva desobedeceram a Deus, os olhos abriram-se e descobriram que estavam nus. Procuraram ser iguais a Deus, dispensaram Deus das suas vidas e descobriram a sua indigência, pobreza, vulnerabilidade. Descobriram que a sua nudez não era só corporal mas carência de todo o conhecimento verdadeiro.
Esta narração do Gênesis escrita de uma forma sapiencial é também para nós. Temos de ter os olhos bem abertos e saber que não somos deuses, mas humanos, mortais. Grande sabedoria é reconhecer esta nossa condição, conhecer-se a si próprio diante de Deus, com as nossas limitações, tendências e fraquezas.
São Paulo no caminho de Damasco ficou cego ao contemplar Cristo ressuscitado, e recuperou a vista quando Ananias lhe impôs as mãos. Recuperou então a sua nudez, não tinha conhecimento da pessoa divina de Jesus, que o amara e morrera na cruz para o salvar e lhe confiaria a evangelização dos gentios.
O evangelista São Mateus mostra no Evangelho que Jesus, no início da sua missão, ao ser tentado, preferiu a pobreza, a humildade e o serviço, enquanto o demônio lhe apresentava a facilidade, o maravilhoso, a notoriedade, o domínio, como um caminho de glória para se impor aos homens e aos poderosos. Adão e Eva são protótipos da humanidade histórica, recusam a sua condição de criaturas com os seus limites para serem deuses. Jesus, que era de condição divina, tomou a nossa natureza humana, humilhou-se, tornou-se servo. Tomou um caminho oposto ao de Adão.
Funchal, 17 de Fevereiro de 2002