5. Na Igreja apostólica encontramos uma abordagem explícita do tema da virgindade como alternativa ao matrimónio, enquanto caminho de vivência cristã do amor. Refiro-me ao texto da 1.ª Carta aos Coríntios (1Cor. 7, 25-39). Trata-se de um texto marcado por uma forte densidade escatológica, dando prioridade às vivências que são da ordem do tempo definitivo, que será inaugurado com a última vinda de Cristo, face às realidades do tempo presente, transitórias por natureza, entre as quais o Apóstolo coloca o matrimónio, mesmo aceitando-o como caminho legítimo de santidade. Passará a figura deste mundo (v. 31).
Deste texto ressaltam algumas características da virgindade escolhida como caminho de fidelidade a Cristo:
* Não é um caminho comum e muito menos se pode impôr. É um carisma, ou seja, uma graça própria e um dom.
* A autoridade de Paulo para propor este caminho é apenas o seu testemunho pessoal e a qualidade de experiência de liberdade que a virgindade pode proporcionar. Não esqueçamos que é o mesmo Apóstolo que disse de si mesmo: para mim viver é Cristo (cf. Gal. 2,20; Fil. 1,21).
* É exactamente na especial relação com Jesus Cristo que Paulo identifica a especificidade da virgindade. Trata-se de uma relação exclusiva, com um coração indiviso, a Cristo, tal como Ele o tinha em relação ao seu Pai Celeste. O homem que não se casa, ocupa-se só nas coisas do Senhor e na maneira de agradar ao Senhor (v. 32). É um estado de vida que une a pessoa a Cristo, sem divisões nem partilhas (v. 35).
* E finalmente Paulo acha que este dom de um coração indiviso ao amor de Cristo, é a vitória definitiva sobre a solidão, porque cumula completamente as necessidades de amor do coração humano. A novidade deste caminho, que é pascal e escatológico, é sugerida num contraste com o Livro do Génesis. Aí se disse, explicando a plenitude do ser humano como homem e mulher, que não é bom que o homem esteja só (cf. Gen. 2,18). Agora Paulo afirma que é preferível que se fique só com o Senhor (v. 40).
Parece claro nesta intuição do Apóstolo que o matrimónio como vitória sobre a solidão não é a solução definitiva. E a experiência humana mostra-nos que não o é. Só Deus vencerá definitivamente o risco da solidão, mesmo para as pessoas casadas. A entrega total de amor a Cristo, que se exprime na virgindade, proporciona uma realização relacional e amorosa, que preenche cabalmente a necessidade humana de amar e ser amado. É por isso que a virgindade não é só, nem denúncia, nem privação. É a abertura à surpresa de Deus, dom inaudito do amor de Cristo, início de uma nova maneira de amar. A virgindade é possível porque é um caminho de amor novo, plenificante e fecundo.