Esse assunto sobre os refugiados é bem precário e complicado! Queremos sempre eleger um bode expiatório para se livrar da própria responsabilidade. Quem os trouxe aqui? Quem os fez entrar neste mar?

Foto Ilustrativa: by Getty Images: Sasiistock.
Já faz anos que tenho convivido com essas pessoas e procuro ajudar no meu possível, e sempre estou a pensar como eu posso fazer mais e melhor essa obra de misericórdia. Como eu, em primeiro lugar, posso passar da teoria à prática.
Eu faço parte do Conselho Geral da Custódia da Terra Santa e passo pelo menos 5 dias em Jerusalém todos os meses. E isso me ajuda a encontrar duas realidades e ver a situação por dois lados, o de Rodes e o de Jerusalém.
Então, por que as pessoas fogem de Gaza?
Bem, agora eles nem podem fugir, porque Gaza se tornou uma prisão, mas as pessoas, quando saiam de Gaza, chegavam em Rodes através da Turquia.
Precisamos entender uma coisa: os traficantes do mar não ganham milhões, eles ganham bilhões com esta “indústria” porque, no desespero, essas pobres pessoas pagam de mil a cinco mil dólares por cabeça. Chegando na Turquia, elas pegavam pequenas embarcações de borracha que cabem 17 pessoas, mas colocam 25 pessoas tornando as embarcações pesadas demais, e, desse modo, as pessoas iam para o mar. E muitas morreram afogadas por não saber nadar, ou mesmo de frio.
As pessoas que chegam a Rodes, o que fazer para ajudar?
O meu apostolado com esses refugiados penso que seja uma gota de água no oceano. Por outro lado, vejo que até um sorriso, uma comunicação na língua deles, mesmo que o meu árabe não seja perfeito, e considerando que a maioria, ou seja 99% são muçulmanos, não são cristãos. Porém, eles vêm até a Igreja Católica porque sabem que serão recebidos e que vamos partilhar o que temos com eles.
Muitas vezes, eu acordo com eles na minha janela gritando “Iaba – Abunã”, que quer dizer padre, pois sabem que eu vou abrir a janela e ajudar.
No início das imigrações em Rodes, existia um galpão enorme em frente ao mar, um antigo matador de boi na cidade.
Os refugiados ficavam ali. Hoje, a prefeitura fechou, e essas pessoas se encontram nas estradas; são crianças, mulheres e jovens. Todos estão na rua!
Diariamente, vamos até eles para partilhar o que temos. Procuro levar chocolates para as crianças, e também materiais de higiene pessoal como: shampoos, sabonetes, pastas de dente.
Para mim, é muito doloroso ver que, ao receberem apenas um sabão de barra, isso lhes traz tanta alegria, algo que a gente nem faz muita causa, porque nem tem grande valor para nós.
Outras vezes, eu me deparo com aqueles que querem simplesmente ser ouvidos; suas experiências e o que deixou para trás no seu país.
Refugiados, Tráfico e Desamparo: A Rede Franciscana como Esperança
Outra realidade, além dos coiotes, é que existem associações internacionais que pegam as crianças, matam-nas e vendem seus órgãos porque são mais valiosos e não estão contaminados. Alguns ricos da Europa que precisam de órgãos pegam essas pobres pessoas porque elas não têm ninguém que as possa defender. Isso não é divulgado na mídia. Mas abramos os olhos, isso tem acontecido.
Outros ainda pedem ajuda para encontrar seus familiares, e para contribuir com essa realidade, na nossa comunidade – a Rede Franciscana para o Mediterrâneo -, trabalhamos para dar a conhecer as pessoas refugiadas, que elas podem pedir ajuda em todos os lugares onde existe uma fraternidade Franciscana, e para isso estamos em fase de desenvolvimento.
Essa situação dos refugiados e migrantes está longe de acabar. Se houver paz em Gaza e as fronteiras se abrirem, eles irão sair, porque, em Gaza, mais de 90% da infraestrutura foi destruída. Eles não tem nada. E essa população que está ali, para onde vão? Os países da Arábia Saudita não querem saber deles. Líbano e Síria já estão com muitos refugiados. O Egito não tem condições para recebê-los. Para onde eles irão? Não temos essa resposta.
Como iremos colocar em prática o nosso pensamento solidário?
Desde que comecei a receber refugiados em Rodes, eu transformei o meu jardim de flores em horta. Hoje, planto batatas e tomates. Sou irlandês e amo batatas. Não é um problema para mim. Coloquei também umas galinhas e elas botam ovos. Isso também ajuda. temos um poço artesiano e usamos a água para as hortaliças. É assim que nossa paróquia se tornou um lugar muito produtivo e que serve para ajudar efetivamente as pessoas. Todas as terças-feiras entregamos alimentos básicos às pessoas.
Leia mais:
.:A guerra tem algum sentido?
.:Reze conosco a Quaresma de São Miguel Arcanjo – 2025
.:Como rezar o terço? – Passo a passo simples
Os novos leprosos do nosso mundo!
São Francisco de Assis sempre nos impulsionou a estar ao lado daqueles que ninguém quer. Eu creio que os leprosos modernos são esses refugiados. Ninguém os quer, nem mesmo os ver ou saber deles.
Eu me sinto realizado em poder acolher essas pessoas. Como disse, atualmente, elas estão nas ruas de Rodes sem banheiro, sem proteção alguma.
Partilho um fato que aconteceu logo no início da chegada dessas embarcações na ilha: um jovem refugiado estava cuidando de um cachorro e, um dia, o serviço de proteção de animais passou por ali e levou embora aquele cachorro, porque julgaram que o lugar não era apropriado para criá-lo.
O ser humano pode ficar ali, mas o cachorro não. E essa mentalidade pobre tem tomado conta de nossas consciências, e damos mais valor ao um animal do que à pessoa humana. Como seres humanos, comecemos a pensar e a colocar em prática dentro de nossas possibilidades, e sair da infantilidade de delegar aos outros aquilo que está ao nosso alcance como cristão, como pessoa humana. E se você puder, ajude-nos a continuar nossa missão como peregrinos da paz e semeadores de esperança.
Frei Luke Gregory, ofm
Pároco Igreja Santa Maria – Rodes
Custódia da Terra Santa
Membro da Comissão Justiça e Paz





