Presentear também o Pai

A Modernidade se constitui no período histórico que imprimiu em nós, “habitantes do tempo”, uma terrível orfandade. A partir do Iluminismo, Revolução Francesa – séc. XVIII – e outros acontecimentos que datam desse período, o homem foi se emancipando do Sagrado e se lançando na conquista de uma pretensiosa e total independência com relação a tudo o que é Eterno, o que acabaria o encarcerando em uma profunda orfandade existencial. Dessa forma, o ser humano – na grande proporção que assumiu tal mentalidade – esqueceu-se de que tinha “Pai”, ou melhor, decidiu assassiná-Lo.

No séc. XIX o homicídio foi totalmente concretizado. A partir de Ludwig Feuerbach – pai do moderno ateísmo científico – e outros que se seguiram em sua vertente de pensamento, a ruptura com o Sagrado e o aniquilamento da “filiação” atingiram seu apogeu.
A sociedade, enfim emancipada e dependente apenas de sua capacidade racional, criou ideologias, teorias e totalitarismos, no intuito de preencher a ausência ocasionada pela orfandade experienciada. Foi em vão. Os cenários do tempo testemunharam as terríveis conseqüências dessa emancipação e de suas ideologias – nazismo, comunismo, etc. –, que muito oprimiram e deixaram um trágico rastro de morte e destruição.

A partir de disso, o homem se percebeu perdido e ausente de referências, pois foi traído por sua “razão” e escravizado por aquilo que ela fabricou. E descobriu que precisava de colo, que precisava novamente de pai… Ele compreendeu que quem ignora seu pai despreza suas próprias raízes e nega sua identidade, e também não encontra refúgio quando tudo parece desmoronar.

Muitos empregaram suas forças em um movimento de retorno, buscando reencontrar raízes, esperança, sentido para a vida e a morte; enfim, buscaram reencontrar o Pai. Outros, porém, desacreditaram-se de tudo não encontrando sentido nem na vida nem na morte – o dito niilismo –, e passaram a conceber a existência como uma constante náusea e uma intensa frustração.

Hoje, na aurora da Pós-Modernidade, muitos têm feito a experiência de novamente se descobrirem como “filhos”, amados e acolhidos por um Pai em comum. Todavia, muitos ainda se encontram em uma caótica – acredito que caos é a expressão mais exata para tal descrição – crise de sentido e valores, gemendo ansiosamente na espera de “adoção”.

Quando no homem é reconstruída a percepção da filiação, emerge em seu interior a compreensão da fraternidade, pois, no amor do Pai todos se descobrem filhos e, conseqüentemente, irmãos amados em comum que trazem em si a sublime missão de igualmente amar. Assim tudo encontra lugar e sentido e inaugura-se para a humanidade um novo horizonte de esperança.

Infelizmente, por conseqüência dos acontecimentos evidenciados, inúmeras pessoas ainda não descobriram que existe um Pai, no qual elas podem descansar de suas lutas e dores, e que deseja apenas as acolher e as amar em sua singularidade.

Diante de tais realidades, no alvorecer desse novo tempo e nessa data especial em que comemoramos o Dia dos Pais, a proposta que se nos apresenta é a seguinte: Optemos também por presentear a Deus, nosso Pai em comum, comunicando com nossa vida e palavras o Seu amor e acolhida aos Seus filhos que ainda se encontram dispersos na orfandade e que precisam descobrir esse abraço do Pai, que os espera ansiosamente. Assim, com certeza, faremos também feliz o coração d’Esse Pai, pois Lhe daremos o presente mais caro a Seus olhos: “O retorno de Seus filhos!”.