Cardeal Hummes: cristão no mundo

Irmãos e irmãs!
O Concílio Vaticano 2º, que tinha como um de seus objetivos re-inserir a Igreja no mundo, procurou mostrar ao leigo cristão que ele tem uma vocação específica no mundo, própria do leigo, além de seu lugar e missão dentro da comunidade da Igreja.

Diz o Concílio que “a índole secular caracteriza especialmente os leigos (…) É específico dos leigos, por sua vocação, procurar o Reino de Deus exercendo funções temporais e ordenando-as segundo Deus. Vivem no século, isto é, em todos e em cada um dos ofícios e trabalhos do mundo. Vivem nas condições ordinárias de vida familiar e social, pelas quais sua existência é como que tecida. Lá são chamados por Deus para que, exercendo seu próprio ofício guiados pelo espírito evangélico, a modo de fermento, de dentro, contribuam para a santificação do mundo. E assim manifestam Cristo aos outros, especialmente pelo testemunho de sua vida resplandecente em fé, esperança e caridade. A eles, portanto, cabe de maneira especial iluminar e ordenar de tal modo todas as coisas temporais, às quais estão intimamente unidos, que elas continuamente se façam e cresçam segundo Cristo, para louvor do Criador e Redentor” (Lúmen Gentium, 31).

Quando este importante texto do Concílio usa palavras como “secular”, “século”, “funções temporais”, “as coisas temporais”, o Concílio está falando do mundo, da sociedade e das coisas da sociedade, ou seja, das coisas que não são internas da Igreja, mas pertencem à vida no meio da sociedade. Portanto, a vocação do leigo o chama a viver sua fé e realizar o Evangelho de Jesus Cristo no meio da vida da sociedade, ou seja, na família, no trabalho, nas coisas da política, da economia, da cultura, dos negócios, das realidades sociais e seus problemas, enfim, no meio de tudo o que compõe a complexa realidade da sociedade humana de hoje.
No evangelho, Jesus diz aos seus discípulos: “Vós sois o sal da terra” e “Vós sois a luz do mundo” (cf Mt 5, 13-14). E acrescenta que não devemos esconder a luz. Ao contrário, “brilhe a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e louvem o vosso Pai que está nos céus” (Mt 5, 16).

Esta luz é Ele mesmo, Jesus Cristo. Nós recebemos esta luz pela fé e no batismo. A luz está em nós, essa luz que é Jesus Cristo e seu Evangelho. Jesus diz que não devemos esconder esta luz, mas que ela deve ser posta num lugar alto, como numa casa, porque então ela vai brilhar para todos. O mesmo se diga do sal. Jesus diz que nós somos sal da terra. Este sal é Ele mesmo e seu Evangelho. Assim como o sal dá um sabor novo e bom ao que não tem gosto, assim Jesus e seu Evangelho renovam tudo neste mundo, dando assim um sabor novo à vida e à história humana. Mas não podemos deixar que este sal, que nos foi dado pela fé e no batismo, fique sem uso em nós e acabe por perder sua força, pois, é verdade que, se não cultivarmos em nosso interior a fé, acabaremos por perdê-la. Ao contrário, devemos fazer uso do sal para salgar a nossa própria vida e para salgar a sociedade, transformando-a segundo os critérios do Evangelho.

Isso vale para todos e cada um dos cristãos. Mas cada um o realizará segundo sua vocação, missão ou ministério próprio. O leigo o deverá fazer segundo sua vocação específica no meio do mundo, ou como diz o Concílio, segundo “a índole secular” de sua vocação. Portanto, será sal da terra e luz do mundo na vida familiar e profissional, no emprego, na convivência com as pessoas do mundo, no exercício de responsabilidades específicas na sociedade, como são funções profissionais, cargos políticos, chefias nos vários setores da vida pública, e assim por diante.

O Concílio fala da complexidade e das contínuas mudanças no mundo de hoje, que exigem grande zelo dos leigos cristãos “um apostolado mais intenso e mais amplo. Com efeito, o aumento constante da população, o progresso da ciência e da técnica, as relações humanas mais estreitas, não só aumentaram o campo de ação do apostolado leigo de maneira extraordinária – campo em grande parte só a eles aberto – , mas criaram também novos problemas, que esperam deles um conscencioso cuidado e estudo. Tal apostolado anuncia-se tanto mais urgente, quanto a autonomia de muitos setores da vida humana, como já se esperava, se desenvolveu ao máximo, por vezes com desvios de ordem ética e religiosa e com grave perigo para a vida crist㔠(Apost. Activitatem, 1).