Dons de Santificação

O dom da sabedoria

Deus distribui seus dons conforme seus desígnios para a salvação dos homens

Para alcançar a vida eterna devemos buscar uma vida santa, de acordo com os mandamentos da lei de Deus e da Santa Mãe Igreja. Nisso reside a verdadeira sabedoria, que não é um dom que brota de baixo para cima, e que não basta o nosso esforço próprio.  É um dom que vem do alto, que vem da graça de Deus e flui por meio do Espírito Santo que conduz, inspira e assiste a Igreja de Deus sobre a terra.

O dom da sabedoria
Foto: Daniel Mafra/cancaonova.com

O Espírito Santo dá a certos fiéis dons de sabedoria, de fé e de discernimento em vista do bem comum, especialmente para a direção espiritual dos fiéis. Os santos destacaram muito o valor desta direção. São João da Cruz, doutor da Igreja, por exemplo, falava da importância da direção espiritual: “Por isso, se a alma deseja avançar na perfeição, deve considerar bem em que mãos se entrega, pois, conforme o mestre, assim será o discípulo; conforme o pai, assim será o filho”. E ainda: “O diretor deve não somente ser sábio e prudente, mas também experimentado. Se o guia espiritual não tem a experiência da vida espiritual, é incapaz de nela conduzir as almas que Deus chama, nem sequer as compreenderá” (Chama, 3). Santa Teresa dizia que o diretor espiritual deve ser sábio, douto e santo.

O dom da sabedoria nos concede o sentido adequado para sabermos apreciar as coisas de Deus; dando ao bem e à virtude o seu verdadeiro valor, e encarando os bens do mundo como degraus para a santidade não como fins em si. Por exemplo, a pessoa que gasta o seu fim de semana para participar de um retiro espiritual, foi conduzido pelo dom da sabedoria, mesmo que não o saiba.

Na ordem natural do conhecimento, a inteligência humana procura fazer uma síntese das suas concepções, de modo a ter uma visão harmoniosa. A mente humana procura atingir os primeiros princípios e as causas supremas de toda a realidade que ela conhece.

A mesma busca harmoniosa ocorre também na ordem sobrenatural. O dom da ciência e do entendimento nos dão uma penetração profunda no significado de cada criatura e de cada verdade revelada respectivamente; oferecem também uma certa síntese dos objetos contemplados, relacionando-os com Deus. Todavia, o dom que, por excelência, efetua essa síntese harmoniosa e unitária, é o da sabedoria. Ela abrange todos os conhecimentos do cristão e os põe diretamente sob a luz de Deus, mostrando a grandeza do plano do Criador e o Seu mistério insondável.

O dom da sabedoria não realiza a síntese dos conhecimentos da fé em termos meramente intelectuais. Ele oferece um conhecimento agradável da verdade, porque é fruto da experiência do próprio Deus feita pelo cristão ou da afinidade que o cristão adquire com o Senhor pelo fato de amar a Deus.

Uma comparação ajuda a compreender isso: para conhecer o sabor de uma laranja, posso consultar, intelectual e cientificamente, os tratados de Botânica; terei assim uma noção aproximada do que seja esse sabor. Mas a melhor maneira para conhecer o gosto da laranja será chupá-la. Os resultados do estudo meramente intelectual são frios e abstratos, ao passo que as vantagens da experiência são concretas.

Os dons da ciência e do entendimento fazem-nos conhecer principalmente pelo amor e afinidade com Deus. É o dom da sabedoria que resulta dessa familiaridade com o Senhor. Ele acontece na medida da íntima união que o cristão tenha com o Senhor Deus. É fruto daquilo que Jesus disse: “Permanecei em mim e eu permanecerei em vós. O ramo não pode dar fruto por si mesmo, se não permanecer na videira. Assim também vós não podeis tampouco dar fruto, se não permanecerdes em mim. Eu sou a videira; vós, os ramos. Quem permanecer em mim e eu nele, esse dá muito fruto; porque sem mim nada podeis fazer ” (João 15,4-5).

Dizia um grande místico que “o dom da sabedoria faz-nos ver com os olhos do Bem-amado; a partir da excelsa atalaia que é o próprio Deus, contemplamos todas as coisas quando usamos o dom da sabedoria”.

Essas verdades nos fazem entender quanto nesta vida é importante o amor de Deus. É este que propicia o conhecimento mais perspicaz e saboroso do mesmo Deus. Os teólogos nos ensinam que veremos Deus face a face por toda a eternidade na proporção do amor com que o tivermos amado nesta vida. O grau do nosso amor, na hora da morte, será o grau da nossa visão de Deus na vida eterna ou por todo o sempre. É por isso que se diz que o amor é o vínculo da perfeição (cf. Cl 3, 14). “No ocaso de sua vida, cada um de nós será julgado na base do amor”, diz São João da Cruz.

Mas isso não quer dizer que se possa menosprezar o estudo, pois, se o Criador nos deu a inteligência, foi para que a apliquemos à verdade por excelência, que é Deus. João Paulo II disse que “a fé e a razão são as duas asas com as quais o espírito humano alça voo para contemplar a verdade” (Fé e razão, n. 1).

Falando do dom da sabedoria, em 14/04/2014, o Papa Francisco disse que “a sabedoria é uma graça que nos permite ver as coisas com os olhos de Deus, a sentir como Deus e a falar com suas palavras; nós temos dentro de nós, no nosso coração, o Espírito Santo; podemos escutá-Lo. Se nós escutamos o Espírito Santo, Ele nos ensina esta via da sabedoria, presenteia-nos com a sabedoria que é ver com os olhos de Deus, ouvir com os ouvidos d’Ele, amar com o coração do senhor, julgar as coisas com o juízo divino. Esta é a sabedoria que nos dá o Espírito Santo e todos nós podemos tê-la. Somente devemos pedi-la ao Espírito Santo”.

“Depois, no matrimônio, por exemplo, os dois esposos – o esposo e a esposa – brigam e depois não se olham ou se o fazem é com a cara amarrada: isto é sabedoria de Deus? Não! Em vez disso, se diz: ‘Bem, a tempestade passou, façamos as pazes’, e recomeçam a seguir adiante em paz: isto é sabedoria? [o povo: Sim!] Sim, este é o dom da sabedoria. Que esteja casa, que esteja com as crianças, que esteja com todos nós!”.

O Papa disse deste modo que não é sabedoria quando “nós vemos as coisas segundo o nosso prazer ou segundo a situação do nosso coração, com amor ou com ódio, com inveja… Não, estes não são os olhos de Deus”. “E obviamente isso deriva da intimidade com Deus, da relação íntima que nós temos com Deus, da relação de filhos com o Pai. E o Espírito Santo, quando nós temos esta relação, nos dá o dom da sabedoria. Quando estamos em comunhão com o Senhor, é como se o Espírito Santo transfigurasse o nosso coração e o fizesse perceber todo o seu calor e a sua predileção.

O Papa Francisco ressaltou que “o coração do homem sábio neste sentido tem o gosto e o sabor de Deus. E quão importante é que nas nossas comunidades haja cristãos assim! Tudo neles fala de Deus e se torna um sinal belo e vivo da sua presença e do seu amor. E isto é uma coisa que não podemos improvisar, que não podemos procurar por nós mesmos: é um dom que o Senhor faz àqueles que se tornam dóceis ao Espírito Santo”.

Santo Agostinho disse que: “A sabedoria é a medida do homem. Uma medida pela qual o homem se mantém em equilíbrio. Sem tentar o impossível nem contentar-se com o insuficiente”. “Não há lugar para a sabedoria onde não há paciência”. Santo Afonso de Ligório disse que: “A verdadeira sabedoria é a sabedoria dos santos: saber amar a Jesus Cristo”. São João da Cruz disse que: “Adquire-se a sabedoria pelo amor, do silêncio e da mortificação; grande sabedoria é saber calar e não se inserir em ditos ou fatos e na vida alheia”.

:: Novena de Pentecostes 


Felipe Aquino

Professor Felipe Aquino é viuvo, pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa “Escola da Fé” e “Pergunte e Responderemos”, na Rádio apresenta o programa “No Coração da Igreja”. Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova. Página do professor: www.cleofas.com.br e Twitter: @pfelipeaquino