Natal

Saiba viver bem o tempo do Natal

Natal, não se trata de um acontecimento de pouca importância, mas “do acontecimento” que mudou a história do mundo

O que fazer dos muitos presentes recebidos nos Natais passados e no Natal que se aproxima? Muita gente acumula coisas em casa e fica abarrotando quartos com brinquedos, armários com aquelas coisas que “um dia poderão servir”. Há pessoas que logo encontram um destino adequado ao que é realmente útil ou, melhor ainda, sabem partilhar o que é supérfluo para elas. Entretanto, valem os gestos de amizade, a troca de atenções e a generosidade dos dias de fim de ano. Mas os presentes de Natal são apenas ponto de partida para outra conversa.

A humanidade recebeu um presente, o maior de todos, quando o Verbo de Deus se fez carne no ventre da Virgem Maria. Não se trata de um acontecimento de pouca importância, mas “do acontecimento” que mudou a história do mundo, diante do qual mudaram as datas e o coração das pessoas. E os cristãos, chamados a cuidar do grande legado da fé, têm a responsabilidade de anunciar a todos a grande notícia, que é alegria para todo o povo e para todas as gerações. “Natal é o encontro com Jesus. Deus sempre buscou Seu povo e o guiou, tomou conta dele e prometeu que estaria sempre perto. No Livro do Deuteronômio, lemos que Deus caminha conosco, guia-nos pela mão como um pai faz com seu filho. Isto é maravilhoso! O Natal é o encontro de Deus com Seu povo, e é também um mistério de consolação” (Papa Francisco, em recente entrevista ao jornal italiano “La Stampa”).

O presente de Deus à humanidade é sinal da condescendência com cada pessoa e com todas as situações vividas. Lição de carinho pensado desde a eternidade no plano de Deus, com o qual fomos feitos por amor, no amor e para o amor. Um mundo que foi planejado para que as pessoas sejam felizes, e não para a perdição.
A plenitude dos tempos, seu amadurecimento realizado, irrompeu quando a Virgem Maria deu à luz o Menino de Belém. Sua presença veio mostrar que a vida humana vale muito, tanto que tem o preço do amor infinito de Deus. Em tempos como o nosso, em que a vida é vilipendiada, desprezada e jogada no lixo das cidades e da história, o Menino do Presépio é testemunha de que a humanidade só encontrará sua estrada de realização e felicidade quando a sementinha de vida for acolhida com amor, tratada com carinho e custodiada da fecundação até seu ocaso natural. Não podemos nos iludir! As falcatruas legais com as quais a vida vem a ser destruída trarão suas consequências, pois o salário do pecado é a morte (Cf. Rm 6, 23).

A Sagrada Escritura está recheada de repreensões feitas pelo Senhor a um povo de cabeça dura. Os sucessivos profetas não hesitaram em lançar em rosto justamente ao povo que pertencia a Deus suas censuras. E o povo de nosso tempo, cuja herança da fé cristã foi dada em legado, o que fez dos valores do Evangelho? Não é segredo que, muitas vezes, o “mea culpa” do reconhecimento dos pecados foi feito por nós cristãos e haverá de ser sempre atual. Não basta nos enfeitarmos em trajes de festa e jogar para debaixo do tapete nossa incoerência. Somos nós os que primeiro devem tomar consciência de que os valores do Evangelho, como a verdade e a sinceridade, o amor à vida e a seriedade na administração dos bens materiais e espirituais foram desprezados e a esperteza ou os interesses passaram na frente.

A falta de lisura na prestação de contas, os desvios de verbas públicas e o “por fora” da corrupção são absolutamente incoerentes com o Cristianismo. Cuidar do presente recebido de Deus é ter a coragem de recomeçar, reconhecer erros cometidos, limpar as mãos e o coração. Este é um apelo urgente, em nome do Natal. A história mostra que o Cristianismo, malgrado as falhas de todos os que o professam, gerou cultura. É impensável separar a arte dos séculos passados da benéfica influência do Evangelho. Nasceram da Igreja expressões pictóricas e esculturais e peças musicais em profusão. Em muito, foi à sombra da Igreja que o teatro se desenvolveu e consolidou. Os monumentos históricos têm incrustados em seus traços as virtudes e os pecados de gerações de cristãos. E a educação ou a saúde e tantas ações sociais? A sensibilidade e a solidariedade foram cultivadas a partir do Evangelho e por ele sustentadas. Ignorar a Igreja, pretender jogá-la no lixo da história é, no mínimo, injustiça. Mas é ainda cegueira pura a pretensa iluminação dos que julgam ser os novos criadores do universo a partir do nada. Assistimos em nossos dias ao espetáculo do laicismo militante, tributário dos muitos desastres que já se entreveem. Parecemos crianças que teimam em por a mão na tomada. O choque já veio e virá!

Muito maior é a vertente positiva, com a qual podemos celebrar mais uma vez o Natal. Continuam verdadeiros os sentimentos mais autênticos nascidos do Presépio. É ainda e sempre será bom e bonito espalhar presentes, ir ao encontro dos mais pobres, experimentar a partilha dos bens, sorrir, saudar os outros com afeto. É nosso programa para estes dias, para recuperar todas as lições dos muitos natais da história e de nossa vida pessoal. É do Papa Francisco a lição do Natal de 2013, na citada entrevista: “Deus nos diz duas coisas. A primeira: tenham esperança. O Senhor sempre abre as portas e nunca as fecha. Ele é o Pai que nos abre as portas. Segunda: não tenham medo da ternura. Quando os cristãos se esquecem da esperança e da ternura, tornam a Igreja fria, sem saber para onde vai e se enrola em ideologias e atitudes mundanas, enquanto a simplicidade de Deus lhe diz: ‘Vá para frente, eu sou um Pai que te acaricia’. Tenho medo quando os cristãos perdem a esperança e a capacidade de abraçar e acariciar”. É tempo de preparar-se, despojando-nos de preconceitos, purificando o coração, jogando fora o que existe de mais velho em nós, o egoísmo, para revestir-nos dos mesmos sentimentos que foram os de Jesus Cristo, Filho de Deus, nascido em Belém, morto e ressuscitado, presente na história, vivo para sempre. A Ele sejam dadas a honra e a glória, hoje e em todos os séculos, pela eternidade.


Dom Alberto Taveira Corrêa

Dom Alberto Taveira foi Reitor do Seminário Provincial Coração Eucarístico de Jesus em Belo Horizonte. Na Arquidiocese de Belo Horizonte foi ainda vigário Episcopal para a Pastoral e Professor de Liturgia na PUC-MG. Em Brasília, assumiu a coordenação do Vicariato Sul da Arquidiocese, além das diversas atividades de Bispo Auxiliar, entre outras. No dia 30 de dezembro de 2009, foi nomeado Arcebispo da Arquidiocese de Belém – PA.