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Características de um seguidor de Jesus

Cada cristão autêntico há de relacionar-se com todos, com a qualidade do amor que recebeu de Jesus Cristo

Nos últimos dias, manifestações de multidões pelas ruas de várias cidades do país chamaram a atenção de toda a sociedade. Líderes autênticos ou forjados, bandeiras, que começam no preço das passagens dos coletivos, passam pelos gastos com a construção de estádios, chegam à chaga da corrupção e da impunidade e incluem o justo reclamo por verbas para a educação e a saúde, um leque aberto e muito complexo. Busca-se entender o que elas significam, pois, aparentemente, tudo andava bem e os detentores do poder não cessam de defender os ganhos econômicos e sociais. Não dá para fazer ouvido de mercador diante de tantos e insistentes gritos!

Os argumentos são diversos, mas todos convergem para uma insatisfação crescente. O descrédito generalizado dos diversos poderes, que se envolvem no jogo político e social, causa forte impressão. Repete-se o ciclo, independente dos partidos que governam, para voltar à insegurança quanto ao futuro. O que acontece? O que fazemos com todos os recursos postos à nossa disposição? Afinal, já somos livres e todos podem fazer e falar o que querem? É que não basta ter moeda mais forte, políticas compensatórias, viagens, aparelhos eletrônicos de todo tipo ou sonhos de consumo que depois se revelam bolhas fugazes. Muito cedo as pessoas percebem que apenas o ter, o poder e o prazer não as realizam. Ainda mais, são expressivos os sinais de que passaremos por frustrações semelhantes a outras partes do mundo e que as pessoas não se transformaram automaticamente em gente feliz. Os pretensos “paraísos terrestres” construídos por mãos humanas desmoronam logo.

De fato, não se trata apenas de um país, mas de transformações globais e radicais, como bem identificou a Quinta Conferência do Episcopado Latino-americano e Caribenho: “Vivemos uma mudança de época, cujo nível mais profundo é o cultural. Dissolve-se a concepção integral do ser humano, sua relação com o mundo e com Deus; aqui está precisamente o grande erro das tendências dominantes do último século que excluem Deus de seu horizonte, falsificam o conceito da realidade e só podem terminar em caminhos equivocados e com receitas destrutivas. Surge hoje, com grande força, uma sobrevalorização da subjetividade individual. Independentemente de sua forma, a liberdade e a dignidade da pessoa são reconhecidas. O individualismo enfraquece os vínculos comunitários e propõe uma radical transformação do tempo e do espaço, dando um papel primordial à imaginação. Os fenômenos sociais, econômicos e tecnológicos estão na base da profunda vivência do tempo, que se concebe fixado no próprio presente, trazendo concepções de inconsistência e instabilidade. Deixa-se de lado a preocupação pelo bem comum para dar lugar à realização imediata dos desejos dos indivíduos, à criação de novos e, muitas vezes, arbitrários direitos individuais, aos problemas da sexualidade, da família, das enfermidades e da morte” (Documento de Aparecida, 44).

Cabe ao cristão participar da vida social e política, compartilhar esperanças, abraçar e semear valores consistentes, dialogar com as diversas forças do tecido social, aprender com quem pensa diferente e oferecer, com clareza e maturidade, o que lhe é próprio. E, aqui, nasce uma pergunta crucial sobre o que é próprio do ser cristão diante dos desafios do tempo presente, que nada tem de cristandade dominante. Ao contrário, este é um tempo de indiferentismo, relativismo e de ateísmo que se espalha.

Com os primeiros cristãos podemos aprender muito para responder a tal pergunta. No ambiente desafiador do Império Romano, alguns dos discípulos de Jesus chegaram à Antioquia e começaram a pregar também aos gregos, anunciando-lhes a Boa Nova do Senhor Jesus, na qual muitos acreditaram e se converteram. Então, enviaram Barnabé à Antioquia e uma grande multidão aderiu ao Senhor. Barnabé partiu para Tarso, à procura de Saulo e o levou à Antioquia. Passaram um ano inteiro trabalhando juntos naquela Igreja e instruíram uma numerosa multidão.

Em Antioquia, os discípulos foram, pela primeira vez, chamados com o nome de “cristãos” (Cf. At 11, 19-30). Em Atenas, “de pé, no meio do Areópago, Paulo tomou a palavra: “Atenienses, em tudo eu vejo que sois extremamente religiosos. Com efeito, observando, ao passar, as vossas imagens sagradas, encontrei até um altar com esta inscrição: ‘A um deus desconhecido’. Pois bem, aquilo que adorais sem conhecer eu vos anuncio. O Deus que fez o mundo e tudo o que nele existe, sendo Senhor do céu e da terra, não habita em templos feitos por mãos humanas” (At 17, 22-24). Num ambiente pagão, os seguidores do “caminho” (Cf. At 9,2), malgrado perseguições e incompreensões, espalharam a Boa-Nova e são muitas outras as missões empreendidas.

De lá para cá, esta é a nossa época, é a nossa vez! Nosso tempo é o melhor que existe para empreender a mesma aventura sem medo! Trata-se de ser coerentes e fiéis a Jesus Cristo (Cf. Lc 9, 23-24). Renunciar a si mesmos, tomar a Cruz e seguir! Renunciar é deixar de lado o apego egoísta aos próprios interesses e a tudo o que é supérfluo, olhar ao redor e ver o bem comum. Cruz, instrumento de salvação, antes de ser caminho de dor é opção pelo amor, o mais importante no Sacrifício de Cristo. Seguimento é percorrer os mesmos passos do Senhor, com a sabedoria para enxergar com lucidez as novas situações que se apresentam.

Ao analisar os fatos e decidir o posicionamento a ser tomado, passa na frente a Verdade, que tem nome (“Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida” – Jo 14,6). No diálogo com as pessoas, não vale o medo de viver de acordo com o Evangelho, pois cada cristão autêntico há de relacionar-se com todos, com a qualidade do amor que recebeu de Jesus Cristo. A participação nos diversos grupos da sociedade, para quem quer ser sal, luz e fermento, faz a diferença de forma positiva, com a escuta sincera das razões das pessoas, sejam quais forem as situações em que se encontrem. Suas mãos e sua “ficha” hão de se manter limpas, mesmo com as eventuais vantagens que possam ser oferecidas por um mundo corrompido. Cabe-lhe sempre a iniciativa e a criatividade na busca de soluções para os problemas sociais. Sua marca há de ser a alegria, fruto da ação do Espírito Santo que conduz a Igreja, a quem pedimos, tornando-nos todos jovens, unidos à Jornada Mundial da Juventude: “Ó Espírito Santo, Amor do Pai e do Filho, com o esplendor da tua Verdade e com o fogo do teu Amor, envia tua Luz sobre todos os jovens para que, impulsionados pela Jornada Mundial da Juventude, levem aos quatro cantos do mundo a fé, a esperança e a caridade, tornando-se grandes construtores da cultura da vida e da paz e os protagonistas de um mundo novo”.


Dom Alberto Taveira Corrêa

Dom Alberto Taveira foi Reitor do Seminário Provincial Coração Eucarístico de Jesus em Belo Horizonte. Na Arquidiocese de Belo Horizonte foi ainda vigário Episcopal para a Pastoral e Professor de Liturgia na PUC-MG. Em Brasília, assumiu a coordenação do Vicariato Sul da Arquidiocese, além das diversas atividades de Bispo Auxiliar, entre outras. No dia 30 de dezembro de 2009, foi nomeado Arcebispo da Arquidiocese de Belém – PA.