Confiança

A fé sem obras é morta

Orar sempre, professar sempre e viver sempre na luz da fé

Nesses dias, participando de um curso com os bispos, no Rio de Janeiro – aliás, foi uma belíssima experiência de reflexão e partilha –, fui tomado por um pensamento que me deixou preocupado.

Foi meditando o texto do evangelista Marcos, quando narra o endemoninhado dizendo: “Vendo Jesus de longe, o endemoninhado correu, caiu de joelhos diante dele, e gritou bem alto: Que tens a ver comigo, Jesus, Filho do Deus altíssimo? Eu te conjuro por Deus, não me atormentes! Com efeito Jesus lhe dizia: Espírito impuro, sai deste homem”! (Mc 5,6-8).

Chamou-me à atenção, porque o demônio acredita, tem fé. Reconhece o Filho de Deus e conjura por Ele. Por que, então, ele faz isso e continua fazendo o mal, atormentando as pessoas? Por que faz um ato de fé e nada muda em sua vida? Nunca muda de caminho, está sempre na contramão da história?

Fiquei pensando e me veio um certo temor. O demônio reconhece Jesus, professa a fé n’Ele, mas não O segue e continua sempre pela própria estrada.

Jamais será diferente, porque sabe quem é Jesus: o Filho de Deus. Mas a sua convicção não interfere no seu modo de agir. É fácil professar a fé, o complicado é deixar essa fé transformar o modo de agir e pensar. Por isso o maligno continuará sempre maligno, porque a fé não tem nada a ver com a vida concreta. A diferença está na fé que me faz, verdadeiramente, ser discípulo de Jesus; caso contrário, eu fico parecendo o demônio, que acredita, faz um ato de fé, mas continua sendo o rei da maldade e do pecado. Vive fazendo de conta que não acredita em Deus.

Confesso que essa reflexão me causou um certo temor e me fez repensar o meu seguimento, enquanto escolhido para a vinha do Senhor e chamado a colaborar com ela.

Entendi melhor a expressão de Jesus: “O único pecado que não tem perdão é o pecado contra o Espírito Santo”. Esse é o pecado, professar com os lábios e negar com as atitudes, ou seja, não deixar Deus agir em nós, porque é Ele que vem ao nosso encontro.

Não fomos nós que amamos Deus, foi Ele quem nos amou primeiro. Negar a iniciativa do Senhor, fechar-se em si mesmo, colocando-se no lugar de Deus, é negar toda e qualquer ação do Espírito Santo. Esse é o pecado que não tem perdão.

Não que Deus não perdoe, mas porque não acreditamos no perdão. Como o Papa Francisco repetiu várias vezes: “Deus não se cansa de perdoar, nós é que nos cansamos de pedir perdão”. O caminho de seguimento a Jesus é um caminho de perdas e ganhos. Perco o meu “jeitão” de ser e aceito o “jeitão” do Mestre e Senhor da minha vida. Serei discípulo se for capaz de assumir a disciplina do Mestre. Não basta dizer “eu creio”, porque a fé sem obras é morta.

No caminho do seguimento do Senhor, ser astuto como a serpente e simples como a pomba são atitudes primordiais para não cairmos na tentação do demônio. É como nós rezamos sempre no Pai-Nosso: “não nos deixeis cair na tentação”. A tentação é exatamente a incoerência do nosso falar e do nosso ser.

Somente quem está em Deus é uma criatura nova, ou seja, renovada, disposta ao seguimento de Jesus como verdadeiro discípulo. Não tenho dúvidas de que o demônio existe; também não duvido de que ele nunca para de trabalhar, principalmente, para nos fazer professar a fé e viver como se Deus não existisse. Orar sempre, professar sempre, viver sempre na luz da fé; assim, nada será inútil; a vida terá outro sentido.

Que Deus abençoe a nossa semana!

Veja também a homilia do Papa Francisco  – Uma fé sem obras são só palavras