O tempo corre implacável, oferecendo-nos, em nome de Deus, incontáveis oportunidades. Mas as pessoas andam apressadas e desejam um dia de quarenta e oito horas, para depois pretenderem mais. A velocidade dos meios de comunicação projeta adultos e jovens para metas sempre mais audaciosas. Alguém um dia disse que “o céu é o limite”, expressão que até foi nome de programa de televisão. É natural que, a certo ponto da caminhada, alguém se pergunte a respeito dos rumos e do sentido da própria existência, como também a respeito dos critérios com os quais organiza o uso do precioso tempo. Sabemos que para Deus um dia é como mil anos e mil anos como um dia (Sl 89,4), mas nós estamos no tempo, dependemos de programa, calendários, agenda.
Até as crianças das etapas iniciais de vida escolar devem ter suas agendas, nas quais se enviam os recados aos pais ou as próprias crianças enfeitam com seus desenhos, números telefônicos e atividades programadas. Deparei-me com o Evangelho de São Marcos 1, 29-39 e pareceu-me ser possível reconstituir a organização da “agenda” de Jesus, para “aprender Jesus” e ajudar muita gente a se programar com critérios semelhantes. Nós o vemos na Casa de Oração dos Judeus, chamada Sinagoga, depois em visita à Casa de Simão e André. Ao cair da tarde, está cercado das multidões que desejam sua palavra e seus milagres. Na madrugada do dia seguinte, ei-lo em oração, num colóquio de amor com o Pai, recolhido em lugar deserto, antes de partir para novas etapas de missão.
A vida se organiza no confronto com Deus, tempo dedicado à oração cristã, que é a oração de Jesus. Oração pessoal e comunitária. Silêncio para estar com Deus e participação na vida da Igreja, sobretudo na missa dominical. Tomar um tempo a cada dia, bem escolhido, quando e como a pessoa se sentir bem, a Bíblia nas mãos, leitura, meditação, oração, contemplação e propósito de vida nova. Depois, como um bonito ramalhete composto com amor, levar tudo ao altar de Deus na Santa Missa. Nossa vida, no dizer do grande Dom Helder Câmara, fragmentada nos múltiplos afazeres, é posta à disposição de Deus. Dos muitos “caquinhos” ele compõe um magnífico mosaico, uma história de salvação.
Jesus vai à Sinagoga, onde todos ficaram admirados com seu ensinamento. Era um ensinamento novo, e com autoridade. E sua fama se espalhou rapidamente por toda a região da Galileia. (cf. Mc 1,21-28).
A Sinagoga era lugar privilegiado para a leitura e o aprendizado da lei, da Palavra de Deus. Até hoje e assim será sempre para os cristãos. Para discernir o que fazer, como fazer e como organizar a vida, faz-se necessário perguntar o que Deus pensa. Não é necessário aguardar revelações extraordinárias. “Já firmada a fé em Cristo e promulgada a lei evangélica nesta era de graça, não há mais razão para perguntar a Deus, desejando visões e revelações divinas, nem para que ele responda como antigamente. Ao dar-nos, como efetivamente nos deu, o seu Filho, que é a sua única palavra, e não há outra, disse-nos tudo de uma vez nessa palavra e nada mais tem a dizer” (cf. São João da Cruz, “Subida do Monte Carmelo”, Livro 2, capítulo 22). Na Palavra está a fonte da vida e a iluminação para as decisões.
Jesus vai à casa de Simão e André. Vêm à tona suas prioridades, que depois se estendem com a atenção aos enfermos e necessitados. Ele está “na casa”, estabelece relações pessoais e afetivas, cuida das pessoas, cultiva-as de tal modo que as contagia. De fato, a sogra de Simão, curada da febre, se põe a servir a todos (cf. Mc 1,31). Ele dedica tempo aos que sofrem mais, doentes, pobres e todos os necessitados. Tal indicação não seja desprezada. Vale a pena perguntar sobre o espaço dedicado em nossas vidas para o serviço gratuito e livre aos mais pobres. E os que sabem ser mais pobres não são dispensados de tal serviço. Antes, devem primar pelo amor uns aos outros, capaz de edificar as outras pessoas.
Muitos de nós já experimentamos ser procurados e visados pelas pessoas, o que aconteceu em primeiro lugar com o Senhor de nossa fé. Observadores mais curiosos do que piedosos notavam o comportamento de Jesus, até vigiando para ver se respeitava o sábado, jejuava ou lavava as mãos antes das refeições ou anotando seu comportamento religioso das prescrições da lei mosaica a serem cumpridas (Cf. Mc 2,16-28; Mc 3, 1-6; Mc 3, 20-21; Mc 7,1-23). É com imensa liberdade e com zelo missionário que Jesus quer pregar a todos e testemunhar o Reino pelo qual é apaixonado. Por isso seu programa contempla ir a outros lugares das redondezas, pois para isso ele veio, age com simplicidade, sem formalismo, com a imensa confiança no amor do Pai, com a qual quer contagiar a todos. Os que nele crêem se sabem sempre entregues às mãos da Providência santíssima, sem traumas ou receios que lhes tirem a liberdade. E assim convivem respeitosamente com todos, inclusive com os que têm convicções diferentes.
A nós cristãos chegue o apelo a olhar para a Cruz de Cristo, ponto mais alto e sinal de seu amor eterno. Nela ele se entregou “como remédio contra todos os males que nos sobrevêm por causa dos pecados, mas não é menor a utilidade quanto ao exemplo. Na verdade, a paixão de Cristo é suficiente para orientar nossa vida inteira. Quem quiser viver na perfeição, nada mais tem a fazer do que desprezar aquilo que Cristo desprezou na Cruz e desejar o que ele desejou. Na cruz, não falta nenhum exemplo de virtude” (Santo Tomás de Aquino, Colatio 6 super Credo in Deum). Assim, nossa vida será “organizada” e nossa agenda perfeita!
Que o Pai do Céu conceda a todos os homens e mulheres de fé o dom de priorizar em suas vidas o que efetivamente tem valor. Por isso a Igreja pede em sua oração que ele vele sobre a sua família com incansável amor, pois confiados apenas em sua graça, esperamos ser guardados sob a sua proteção.