"Onde estava Deus?"

O Papa Bento XVI visitou, no mês passado, o campo de concentração de Auschwitz, onde milhares de judeus foram mortos pelo regime nazista. Ali, o Papa fez algumas perguntas que muitos não entenderam, e a imprensa erroneamente interpretou como se o Papa tivesse vacilado na fé:
“Onde estava Deus naqueles dias? Por que Ele silenciava? Como pôde tolerar este excesso de destruição, este triunfo do mal?”

Até mesmo muitos católicos ficaram assustados com as perguntas do Papa, como se ele realmente tivesse vacilado na fé. Nada disso.

Na verdade, o Papa fazia apenas uma reflexão, que muitos não entenderam a forma. Pois foram perguntas “retóricas”, usadas pelo pregador para despertar o interesse do ouvinte e motivá-lo a encontrar a resposta para os fatos; nunca por falta de fé. A partir delas, expõe suas idéias sobre o tema. Os Salmos estão repletos de perguntas dessa natureza: “Desperta, Senhor, por que dormes? Desperta e não nos rejeiteis para sempre. Por que escondes a tua face e te esqueces de nossa miséria e tribulação?” (Sl 44,24-25).

Este recurso nada mais é do que uma forma de meditação, e que a imprensa leiga por não entendê-la, acabou por interpretá-la mal; assim como ocorreu também com alguns cristãos. Dom Murilo Krieger interpretou muito bem as palavras do Papa, afirmando: “O Papa lembrou que nosso grito a Deus deve ser ao mesmo tempo um grito que penetre nosso próprio coração, para que aquele poder que Ele ali colocou não seja coberto e sufocado em nós pela lama do egoísmo, do medo, da indiferença e do oportunismo”.

Devemos gritar a Deus, sim, para que impulsione os homens a arrepender-se! Para que reconheçam que a violência não cria a paz, mas suscita apenas outra violência – uma espiral de destruição, na qual todos, no fim das contas só têm a perder, como ressaltou o Santo Padre. E continuou: “Nós rezamos a Deus e gritamos aos homens […] para que a razão do amor e do reconhecimento da força da reconciliação e da paz prevaleça sobre as ameaças circunstantes da irracionalidade ou de uma falsa razão, separada de Deus.”

O Papa concluiu suas palavras, em Auschwitz, rezando o salmo 22, do Bom Pastor, para mostrar que Deus está em toda parte como Bom Pastor; conduzindo-nos por caminhos retos e para verdes pastagens, mesmo que tenhamos de atravessar vales tenebrosos, quando permitimos.

Portanto, não houve qualquer fraquejamento na fé do Papa, mas simplesmente uma bela maneira de fazer uma profunda reflexão, que muitos, infelizmente, não entenderam.


Felipe Aquino

Professor Felipe Aquino é viuvo, pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa “Escola da Fé” e “Pergunte e Responderemos”, na Rádio apresenta o programa “No Coração da Igreja”. Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova. Página do professor: www.cleofas.com.br e Twitter: @pfelipeaquino