Hoje em dia, é comum encontrarmos doutrinas equivocadas que associam a proximidade de Deus a momentos de sucesso, enquanto veem as tribulações como sinais de um afastamento d’Ele. A realidade da fé cristã é bem diferente: muitas vezes, é justamente no sofrimento que Deus mais se aproxima de nós.

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Uma reflexão sobre tribulações
As tribulações não são apenas inevitáveis, mas também preciosas. Elas nos aproximam da cruz de Cristo e revelam o verdadeiro sentido do sofrimento. Na lógica do Evangelho, a verdadeira alegria e comunhão com Deus, muitas vezes, nascem no sacrifício.
“Sobre todas as graças e dons do Espírito Santo que aos seus amigos Cristo concede, está o de se vencer cada um a si mesmo, e o de, voluntariamente e por seu amor sofrer penas, injúrias, desprezos e opróbrios, e dos dons de Deus nos não podemos gloriar, porque nossos não são, mas seus, por onde diz o Apóstolo: “Que tens tu que o não hajas recebido de Deus? E se o recebeste, porque te glorias, como se de ti o houvesses?» Na cruz, porém, e na tribulação, podemos gloriar, que isto é nosso, e assim diz o Apóstolo: «Não me quero gloriar, senão na cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo». A quem toda a honra e glória seja dada, por todos os séculos dos séculos.” (São Francisco de Assis)
Muitos santos foram provados na dor, e foi justamente na dor que alcançaram a verdadeira vitória. Um grande exemplo é Santo Atanásio, bispo de Alexandria. Por sua fidelidade à Verdade, enfrentou uma longa e dura perseguição que se estendeu até o fim de sua vida. Santo Atanásio foi exilado várias vezes, caluniado, perseguido por imperadores e por muitos bispos. Apenas após sua morte, a Igreja coroou a sua luta.
Exemplo de Santo Atanásio
Santo Atanásio viveu entre os anos de 296 e 373. Apesar de ter crescido em meio às perseguições romanas contra os cristãos, ainda jovem testemunhou uma grande virada na história da Igreja: o imperador Constantino, com o Édito de Milão em 313, concedeu liberdade ao cristianismo. Mais tarde, Atanásio tornou-se bispo de Alexandria, no Egito. Era um bispo ortodoxo, firme na doutrina e profundamente fiel à fé recebida dos apóstolos.
No entanto, se, por um lado, cessavam as perseguições sangrentas do Império, por outro começava uma nova e perigosa ameaça: o surgimento das heresias dentro da própria Igreja. A heresia ariana, defendida por Ário, um presbítero de Alexandria, negava a divindade de Jesus Cristo. Segundo Ário, o Filho não era consubstancial ao Pai, mas uma criatura, ainda que superior às demais. Em outras palavras, Cristo não seria verdadeiro Deus, mas apenas semelhante a Deus. Mas em tempos de crise, Deus levanta grandes santos para proteger a Igreja. E foi justamente nesse contexto que Santo Atanásio cresceu como o grande defensor da divindade de Cristo. A sua vida foi testemunho da promessa Dele: “As portas do inferno não prevalecerão” (Mt 16,18).
A heresia ariana corrompeu não apenas o Império, mas também contaminou profundamente o clero, muitos dos quais se deixaram seduzir pela tentação de Ário e sua falsa doutrina. Atanásio foi duramente perseguido por combater essas novidades heréticas.
O primeiro exílio
Ocorreu entre os anos de 335 e 337, durante o reinado do imperador Constantino. Atanásio foi acusado injustamente pelos arianos, que o acusaram de ter interrompido o fornecimento de trigo ao Egito e de outras irregularidades. No Concílio de Tiro, manipulado por bispos arianos, ele foi deposto e enviado ao exílio na cidade de Tréveris, na atual Alemanha. Após a morte de Constantino, em 337, Atanásio pôde retornar ao Egito com o apoio de Constante, imperador do Ocidente.
O segundo exílio
Se deu entre 339 e 346, sob o imperador Constâncio II, que favorecia o partido ariano. Atanásio foi novamente removido de sua sede, e um bispo ilegítimo, Gregório de Capadócia, foi nomeado em seu lugar. Atanásio fugiu para Roma, onde foi acolhido pelo Papa Júlio I e reconhecido como legítimo bispo de Alexandria. No Concílio de Sárdica, realizado em 343, sua legitimidade foi reafirmada. Com o apoio de Constante, ele retornou a Alexandria em 346.
O terceiro exílio
Começou em 356, ainda sob o domínio de Constâncio II. Após a morte de Constante, Constâncio se tornou imperador único e intensificou a perseguição contra os defensores da fé nicena. Atanásio foi novamente condenado e precisou se esconder, passando cerca de seis anos refugiado em mosteiros no deserto egípcio. Com a morte de Constâncio, em 361, e a ascensão de Juliano, que restabeleceu a liberdade religiosa, Atanásio pôde voltar a Alexandria em 362.
O quarto exílio
Logo em 362, o imperador Juliano, que buscava restaurar o paganismo e via Atanásio como uma ameaça por sua influência entre os cristãos, ordenou sua expulsão. Atanásio fugiu novamente. Após a morte de Juliano em 363, o novo imperador, Joviano, que era cristão e favorável ao credo niceno, permitiu seu retorno.
O quinto e último exílio
Aconteceu em 365, quando o imperador Valente, também simpático ao arianismo, mandou expulsar Atanásio mais uma vez. Contudo, devido à forte pressão popular, a decisão foi rapidamente revertida e Atanásio retornou definitivamente à sua sede episcopal em 366. Ele permaneceu como bispo de Alexandria até sua morte, em 373, sendo mais tarde proclamado Doutor da Igreja e reconhecido como um dos maiores defensores da ortodoxia cristã na Antiguidade.
Deus não abandona a sua Igreja
Os frutos da grande perseguição e dos sofrimentos suportados por Santo Atanásio, ainda hoje, são colhidos pela Igreja. Se temos uma doutrina tão firmemente estabelecida pelo Magistério, isso se deve, em grande parte, à luta de Atanásio contra as heresias que ameaçavam a fé. Sete anos após sua morte, o Concílio de Constantinopla declarou anátema os arianos e confirmou solenemente a doutrina da divindade de Cristo por meio do Credo Niceno-Constantinopolitano.
Santo Atanásio não viveu uma vida de comodidades. Muito pelo contrário, a sua certeza estava no Evangelho e no desejo sincero de servir a Cristo e ao seu Corpo Místico, que é a Igreja. Ele sabia que sua recompensa não seria nesta vida, e é essa convicção que o fortalecia. Atanásio foi um dos maiores defensores da Igreja: preservou a doutrina ortodoxa e combateu as hereges. A esse grande homem, Deus reservou muitas recompensas na eternidade.
Matheus Eleutério – estudante de jornalismo