A Palavra de Deus nos convida para refletir – em Lucas, 7, 36-8,3 – sobre o perdão misericordioso de Nosso Senhor Jesus Cristo. O contexto da cena é um banquete. Jesus participa como convidado. Oferecem-Lhe os seus dons duas pessoas muito diversas: um fariseu e uma mulher de má fama.
O primeiro o convida para um almoço suntuoso. Seria exagerado acusá-lo de vontade má; talvez tenha convidado o Senhor porque sentia respeito por Ele. Todavia, no fundo de seu gesto, existe um sentido de crítica e de suspeita, e por isso ousa julgar-Lhe a conduta. Ele tem sua verdade feita, conhece a Deus e não tem necessidade de que alguém lhe ensine a nova profundidade do Reino e da vida.
A segunda não foi convidada, mas se apresenta espontaneamente. Sabe que Jesus oferece uma mensagem salvadora, conheceu a Sua virtude de homem que se dedica inteiramente aos outros e, portanto, vem oferecer ao Senhor simplesmente aquilo que tem: o perfume que usa no seu trabalho, as suas lágrimas e os seus beijos. Tomado em si, este gesto é ambivalente. O fariseu, fiel às suas normas de moralidade estreita, condena a mulher, qualifica o seu gesto de ligeireza e julga Jesus que se deixa tratar daquele modo. Cristo, em vez disso, interpretou a atitude da mulher como um ato do seu amor, como expressão de gratidão por ter sido compreendida e perdoada.
A visão de Jesus Cristo é compreendida melhor por meio de uma parábola: entre dois devedores insolvíveis, amará mais o Senhor aquele ao qual foi perdoado um débito maior. Aplicando a parábola precisa-se, de modo melhor, a atitude do fariseu e a da prostituta.
O fariseu Simão e a mulher pecadora encarnam duas atitudes diante de Deus, como o fariseu e o publicano de uma outra parábola representam dois tipos de religiosidade (cf. Lucas 18,10-14). Mas aqui os modelos são reais e interpretam ao vivo uma nova parábola de Jesus: a dos dois devedores insolventes e perdoados. Simão é o que deve cinquenta dinheiros e a mulher quinhentos. Depois que o débito de ambos é perdoado, é claro quem é mais grato pelo favor, isto é, quem ama mais: a mulher cujos gestos de afeto para Jesus, diferente da cortês reprovação do fariseu, demonstram somente amor e alegria pela experiência do perdão.
O amor que nos demonstra quem nos perdoa, Isso é Deus, é o que regenera a pessoa. Por isso devemos começar por reconhecer a nossa situação do pecado. Encarnamos o fariseu Simão quando perdemos a consciência de ser pecadores, coisa que efetivamente estão perdendo o homem e a mulher de hoje. Não se trata de um sentimento doentio, mas realístico de culpabilidade. Julgar com dureza os outros sem pensar que também nós erramos e temos necessidade do perdão de Deus, como Davi pecador e a mulher pecadora, significa esquecer que diante do Todo-poderoso somos todos devedores insolventes.
O perdão de Deus, como o Seu amor, é gratuito: talvez por isso, por causa da nossa mentalidade mercantilística, não o avaliamos bastante. Jesus ensina hoje que não nos libertamos do pecado com nossas forças (é a atitude do fariseu), mas aceitando o perdão e o amor gratuitos de Deus (atitude da pecadora). Isso diz respeito ao Altíssimo; e em relação aos irmãos, quem não se sente pecador não pode colaborar para construir um mundo melhor, porque é incapaz de começar de novo, mudando a si mesmo pessoalmente e aceitando depois os outros assim como são.
Em Cristo, Deus se colocou do lado do homem, pelo perdão e a reconciliação. O perdão de Deus Pai, por Sua disposição, se realiza, no sacramento da reconciliação ou penitência, através do qual a Igreja se reconcilia com Deus e recupera para a comunidade o membro pecador. Mas a reconciliação se faz já no momento em que no íntimo de nosso coração percebemos que ofendemos a Deus e ofendemos nosso próximo, e pedimos perdão na confiança de que o Senhor nos perdoa porque Ele mesmo tomou a iniciativa de oferecer-nos o perdão.
A grandeza do perdão que o Todo-poderoso fez e faz é provado pela grandeza do amor que esse perdão suscita. Lembremo-nos do caso de David, de Pedro, de Paulo, de Agostinho, para que confiemos na bondade de nosso Deus nosso Pai, como nos garante Seu Filho Jesus Cristo.