A sociedade precisa refletir sobre suas atitudes e não colocar o poder a frente de tudo
A sociedade competitiva em que vivemos suscita a corrida pelo poder, pelo prazer e pela riqueza. A cada momento assistimos a concorrência pelos cargos políticos aqui e no mundo inteiro. Perguntado recentemente a respeito das eleições presidenciais nos Estados Unidos, o Papa Francisco respondeu magistralmente: “Eu não emito julgamentos a respeito de pessoas e sobre os homens políticos. Quero apenas que tomem conhecimento dos sofrimentos que seu modo de agir causa na vida dos pobres e dos excluídos”.
Depois, perguntado sobre a desafiadora audiência concedida aos representantes dos Movimentos Populares, reagiu de forma impressionante. O jornalista de “La Repubblica” assim de expressou: “O senhor me disse, há um tempo atrás, que o preceito ‘Ama o teu próximo como a ti mesmo’ poderia ser mudado e transformar-se em ‘mais do que a ti mesmo’. Significa que o senhor pensa numa sociedade marcada pela igualdade. Isso, como o senhor sabe, é o programa do socialismo marxista e depois do comunismo. Quer dizer que pensa numa sociedade de tipo marxista?” E o Papa; “Mais de uma vez se referiram a mim dessa forma e minha resposta foi sempre que, se for assim, são os comunistas que pensam como os cristãos, e não o contrário. Cristo falou de uma sociedade em que os pobres, os fracos, os excluídos, sejam eles a decidir. Não os demagogos, os ‘barrabazes’, mas o povo, os pobres, tenham ou não fé no Deus transcendente. A eles devemos ajudar para adquirir a igualdade e a liberdade”.
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O Reino de Deus
O Papa e toda a Igreja não sonham com um reino desse mundo, pois sabem que o Reino de Deus, e estamos para celebrar a Solenidade de Cristo Rei, está no meio de nós, onde quer que se encontrem seus valores. A Liturgia diz que é um Reino eterno e universal, Reino da verdade e da vida, reino da santidade e da graça, reino da justiça, do amor e da paz! Se quiserem ser autênticos, os cristãos não se identificarão com os sistemas políticos e muito menos com os partidos políticos. Nenhuma vitória em qualquer mecanismo eleitoral, de qualquer país do mundo, poderá se arvorar em proprietária do bem e da verdade. Os que assumem funções públicas, tendo recebido muito, deverão prestar severas contas a Deus e à própria consciência. A referência haverá de ser justamente os valores do Reino de Deus, capazes de iluminar uma contínua e corajosa revisão de vida.
Encontrando-se com os Movimentos Populares, que muitas vezes se consideram diferentes dos que detêm o poder, pensando que o lado “de cá”, onde estes mesmos se encontram, também usou palavra fortes que, acolhidas seriamente, podem contribuir para a superação de conflitos e radicalizações existentes em nosso tempo:
“Queridos irmãos e irmãs, a corrupção, a soberba e o exibicionismo dos dirigentes aumentam o descrédito coletivo, a sensação de abandono e alimenta o mecanismo do medo que apoia este sistema iníquo. Para concluir, gostaria de vos pedir que continueis a contrastar o medo com uma vida de serviço, solidariedade e humildade a favor dos povos e sobretudo dos que sofrem. Podereis errar muitas vezes, todos erramos, mas se perseverarmos neste caminho, cedo ou tarde, veremos os frutos. O amor cura tudo. Alguns sabem que depois do Sínodo sobre a família escrevi um documento que tem como título ‘A alegria do amor’ — um documento sobre o amor nas famílias, mas também naquela outra família que é o bairro, a comunidade, o povo, a humanidade… Nele se encontram alguns ‘conselhos úteis’ para praticar o mandamento mais importante de Jesus. Ali, cito um saudoso líder afro-americano, Martin Luther King, o qual sabia escolher sempre o amor fraterno até no meio das piores preocupações e humilhações. Quero recordá-lo hoje convosco: ‘Quando te elevas ao nível do amor, da sua grande beleza e poder, a única coisa que procuras derrotar são os sistemas malignos. Amas as pessoas que caíram na armadilha daquele sistema, mas procuras derrotar aquele sistema. Ódio por ódio só intensifica a existência do ódio e do mal no universo. Se eu te firo e tu me feres, e restituo-te a pancada e tu restituis-me a pancada, e assim por diante, é evidente que se continua sem fim. Simplesmente nunca acaba. Nalguma parte, deve haver alguém que tem um pouco de bom senso, e aquela é a pessoa forte. A pessoa forte é aquela que é capaz de cortar a cadeia do ódio, a cadeia do mal’ (n. 118; Sermão na igreja batista de Dexter Avenue, Montgomery, Alabama, 17 de novembro de 1957). Disse isto em 1957. Agradeço-vos o vosso trabalho, a vossa presença. Desejo pedir a Deus nosso Pai que vos acompanhe e vos abençoe, que vos encha do seu amor e vos defenda no caminho dando-vos em abundância a força que nos mantém em pé e nos dá a coragem para cortar a cadeia do ódio: aquela força é a esperança”.
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O amor tem o poder de mudar
Não é o poder que muda as pessoas e o mundo. Não conseguiremos transformá-lo com base em “pensamento positivo”. Só o amor, derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado, constrói novas relações entre as pessoas. Em sua aparente fraqueza, o que muda o mundo é a confissão do Bom ladrão – “Lembra-te de mim, quando começares a reinar” e a proclamação de Jesus, que nos alcança a todos: “Ainda hoje estarás comigo no Paraíso” (Cf. Lc 23, 25-43). Venha o Paraíso!
Com a Festa de Cristo Rei, encerra-se o Ano Jubilar da Misericórdia, proclamado pelo Papa Francisco. Deus sabe a quantidade de pessoas que se deixaram lavar pelo Sacramento da Penitência ou Reconciliação. Os sacerdotes experimentaram a graça de ser instrumentos do perdão. Basta recordar a Jornada da Reconciliação, realizada durante o XVII Congresso Eucarístico Nacional, quando Bispos e Padres se espalharam pelas Paróquias da Arquidiocese de Belém. Ou podemos pensar na Quadra Nazarena, durante o Círio de 2016, contemplando as filas de penitentes que acorriam à Basílica de Nazaré. E o que dizer do apelo à prática das Obras de Misericórdia? Ou quantas pessoas se visitaram e se reconciliaram, permitindo à graça de Deus entrar nos corações e curar o tecido social.
Por tudo isso, demos graças a Deus. E ressoe, mais uma vez, a exclamação jubilosa da Igreja: “Vosso é o Reino, o poder e a glória para sempre”. Continuaremos a clamar, cheios de esperança: “Venha a nós o vosso Reino!”