Esperança

Há um futuro promissor para a humanidade?

Será que as previsões relativas ao aquecimento global ou outras projeções pessimistas se realizarão?

As cenas de violência, que acompanham as manifestações de protesto das mais diversas bandeiras, multiplicam-se por toda parte. Ao mesmo tempo, a humanidade fica chocada com acidentes de toda ordem, desastres naturais, a grande chaga da guerra e o desentendimento entre pessoas, grupos e culturas. Aquela que uma vez foi chamada de aldeia global se mostra diariamente em nossas casas. Há inclusive meios de comunicação que se comprazem em mostrar, ao vivo e a cores, a miséria humana, tirada do fundo do baú, aquela que outrora se encontrava escondida na sarjetas da vida ou dissimulada através de mil truques. E o que dizer da exposição das pessoas e seus eventuais deslizes, através das chamadas redes sociais? Para muitos, a tentação que vem à tona é a do desânimo. Pode ser ainda a banalização da vida das pessoas e de sua dignidade. Outros são levados inclusive ao desespero.

Há um futuro promissor para a humanidade? Será que as previsões relativas ao aquecimento global ou outras projeções pessimistas se realizarão? Bem perto de nós, como serão os próximos meses com os eventos esportivos e políticos que se avizinham? Seremos capazes de nos manter serenos e fiéis? Jesus, conversando com seus discípulos, reunidos no Cenáculo, por ocasião da última Ceia, pronunciou palavras de fogo, garantindo-lhes as forças necessárias para a caminhada neste mundo. Temos certezas que nos permitem ir ao encontro dos outros sem receios, ajudando a todos na descoberta dos sinais de vida e de esperança.

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Para os cristãos existe um ponto de referência, projetado pela esperança, uma virtude teologal. Virtudes teologais, Fé, Esperança e Caridade (Cf. Compêndio do Catecismo da Igreja Católica, 384-387), são aquelas que têm como origem, motivo e objeto imediato o próprio Deus. São infundidas com a graça santificante, tornando-nos capazes de viver em relação com a Trindade, fundamentam e animam o agir, consolidando e vivificando as virtudes humanas. Elas são a garantia da presença e da ação do Espírito Santo em nós. Pela fé, cremos em Deus e em tudo o que Ele nos revelou e que a Igreja nos propõe para acreditarmos. Pela esperança, desejamos e esperamos de Deus a vida eterna como nossa felicidade, colocando a nossa confiança nas promessas de Cristo e apoiando-nos na ajuda da graça do Espírito Santo para merecê-la e perseverar até ao fim da vida terrena. A caridade, por sua vez, é a virtude teologal pela qual amamos a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a nós mesmos por amor de Deus. Jesus faz dela o mandamento novo, a plenitude da lei. A caridade é o vínculo da perfeição (Cf. Cl3,14) e o fundamento das outras virtudes, que ela anima, inspira e ordena: sem ela “não sou nada” e “nada me aproveita”, afirma São Paulo (Cf. 1Cor13,1-3).

A vida cristã tem sua origem em Deus, que nos chama a partilhar de sua vida e nos oferece a salvação. Quer dizer que a vida, quando começa no alto, tem sentido e rumo. Há uma meta a alcançar e esta é a felicidade plena na eternidade, com Deus e com os irmãos. De fato, Deus nos fez para chegar a esta realização completa e a maldade ou o pecado não têm a última palavra.

Para manter viva a esperança, é necessário acreditar que Deus tem algo a ver com a humanidade e pode, sim, intervir na história humana e na vida das pessoas. Só Ele pode fazê-lo sem violentar a liberdade, dom com que todos foram criados. Há um percurso a fazer, para que se mantenha viva a certeza de sentido na vida humana nesta terra, tantas vezes “vale de lágrimas”, mas destinada a ser lugar de felicidade, “um novo céu e uma nova terra, descendo do céu, de junto de Deus, vestida como noiva enfeitada para o seu esposo, a morada de Deus-com-os-homens. Eles serão o seu povo, e o próprio Deus-com-eles será seu Deus. Ele enxugará toda lágrima dos seus olhos. A morte não existirá mais, e não haverá mais luto, nem grito, nem dor, porque as coisas anteriores passaram. Estas coisas serão a herança do vencedor, e eu serei seu Deus, e ele será meu filho” (Ap 21, 1.3-6).

O ponto de chegada é muito alto, mas não é complicado caminhar até lá! Basta seguir a receita do Evangelho: Quem ama enxerga e entende o que deve fazer: “Quem me ama será amado por meu pai e eu o amarei e me manifestarei a ele”. Não é apenas conversa, pois “quem acolhe e observa os meus mandamentos, esse me ama” (Jo 14, 15-21). Trata-se de praticar os mandamentos! Depois, quem compromete assim sua liberdade e sai de si para amar a Deus e cumprir os mandamentos, tem a certeza de que o Espírito da Verdade, prometido por Jesus, permanece sempre dentro de si e a seu lado. Sabendo que o Espírito Santo prometido age no mundo e na Igreja, não desfaleceremos no caminho e a esperança permanecerá acesa.

Uma das consequências é o testemunho a ser oferecido diante das pessoas. Mesmo quando aparece o sofrimento, é melhor sofrer praticando o bem, se essa for a vontade de Deus, do que praticando o mal. Cristo morreu, justo pelos injustos, para nos conduzir a Deus, mas recebeu nova vida no Espírito (Cf. 1 Pd 3, 15-18). Quando alguém quer saber os motivos da esperança que está em nossos corações, começamos com o Céu, mostramos o rumo futuro, a meta da esperança, mas também olhamos para a terra, enxergando os sinais de Deus existentes no momento presente, ao identificar o bem que é feito e a bondade que se espalha ao nosso redor. Há muita caridade vivida, há muitos gestos gratuitos e generosos, assim como tanta doação de vida. Há pessoas acendendo sinais verdes de esperança, ao invés de se armar com o amarelo do semáforo do medo ou interromper a caminhada com o vermelho que interrompe o trânsito da vida. Que nossa vida corresponda à fé, esperança e caridade que nos foram dadas de presente.


Dom Alberto Taveira Corrêa

Dom Alberto Taveira foi Reitor do Seminário Provincial Coração Eucarístico de Jesus em Belo Horizonte. Na Arquidiocese de Belo Horizonte foi ainda vigário Episcopal para a Pastoral e Professor de Liturgia na PUC-MG. Em Brasília, assumiu a coordenação do Vicariato Sul da Arquidiocese, além das diversas atividades de Bispo Auxiliar, entre outras. No dia 30 de dezembro de 2009, foi nomeado Arcebispo da Arquidiocese de Belém – PA.