O dom de piedade torna o cristão consciente de sua participação na família dos filhos de Deus
No mundo materialista, hedonista e distante de Deus, em que hoje vivemos, não são muitas as pessoas que vivem uma intimidade com Ele e que pautam sua vida segundo as santas leis do Senhor; não são muitas as pessoas fervorosas no cumprimento das Escrituras, da vontade de Deus e na busca dos valores eternos.
Foto: Daniel Mafra/cancaonova.com
O dom de piedade nos leva a amar Deus profundamente e viver em comunhão com Ele, desejando sempre fazer a Sua vontade. Às vezes, esse dom é mal entendido pelos que a representam de mãos juntas, olhos baixos e orações intermináveis.
O dom da piedade nos leva a amar e reverenciar tudo que é de Deus: a oração individual, a oração litúrgica, a vida sacramental, a adoração ao Santíssimo Sacramento, a reza do santo terço, o desejo de pregar a Palavra de Deus, a meditação da Palavra, a leitura de bons livros, o zelo pelas coisas sagradas etc.
Esse dom nos faz devotos. A devoção é a rainha das virtudes. A prática da devoção tem de atender a nossa saúde, as nossas ocupações e deveres particulares. A verdadeira devoção nada destrói; ao contrário, tudo aperfeiçoa. Se tens uma vontade sincera de entrar nas veredas da devoção, procura um guia sábio e prático que te conduza”, disse São Francisco de Sales.
A palavra “piedade”, no seu sentido original, diz respeito à atitude de uma criança para com seus pais: uma combinação de amor, confiança e reverência. Se essa é a nossa disposição habitual para com o nosso Pai, estamos vivendo o dom de piedade.
Esse dom do Espírito Santo leva-nos a praticar a virtude, a manter uma atitude de confiante intimidade e familiaridade com Deus. Leva-nos a conversar com Ele como um filho conversa com seu pai ou com sua mãe, com naturalidade, espontaneidade, confiança e amor.
O dom do Espírito nos orienta divinamente em todas as relações que temos com Deus e com o próximo, tornando-as mais profundas e perfeitas. São Paulo se refere a este dom quando escreve: “Recebestes o espírito de adoção filial, pelo qual bradamos: “Abbá, ó Pai” (Rm 8, 15). O Espírito Santo, mediante o dom da piedade, faz-nos, como filhos adotivos, reconhecer Deus como Pai.
E pelo fato de reconhecermos Deus como Pai, consideramos as criaturas com olhar novo, inspirado pelo mesmo dom, o qual nos leva a não considerar tanto os benefícios recebidos da parte de Deus, mas, muito mais, o fato de que Ele é sumamente santo e sábio: “Nós vos damos graças por vossa grande glória”, diz a Igreja no hino da liturgia eucarística; é, sim, próprio de um filho olhar a honra e a glória de seu pai sem levar em conta os benefícios que ele possa receber do mesmo.
É o dom da piedade que leva os santos a desejar, acima de tudo, a honra e a glória de Deus, “… para que em tudo seja Deus glorificado”, diz São Bento; ao passo que Santo Inácio de Loiola exclama: “… para a maior glória de Deus”.
É também o dom da piedade que desperta no cristão viva e inabalável confiança em Deus Pai, confiança e entrega como, por exemplo, dá testemunho Santa Teresinha de Lisieux na sua doutrina sobre a infância espiritual.
O dom de piedade não estimula os cristãos apenas a cumprir seus deveres para com Deus de maneira filial, mas os leva também a experimentar interesse fraterno para com todos os seus semelhantes. Típico exemplo desse sentimento encontra-se na vida de São Francisco de Assis: quando este, certo dia, sonhando com as glórias de um cavaleiro medieval, avistou um leproso, sentiu-se movido a superar qualquer repugnância e a dar-lhe o beijo que exprimia a fraternidade de todos os homens entre si.
O dom de piedade, tornando o cristão consciente de sua participação na família dos filhos de Deus, move-o a ultrapassar as categorias do direito e do dever, a fim de testemunhar uma generosidade que não regateia nem mede esforços desde que sirva aos irmãos. É o que manifesta o apóstolo ao escrever: “Quanto a mim, de bom grado me despenderei, e me despenderei todo inteiro, em vosso favor” (2Cor 12, 15).