Igreja

Eis que faço novas todas as coisas

Os dias que antecederam a eleição do Santo Padre, o Papa Francisco, foram repletos de especulações, seja em torno do nome do futuro Pontífice, seja na busca da novidade ou da renovação da Igreja. Muitos viam a necessidade de um Papa “progressista”, entendido como um Pontífice que viesse a mudar os rumos da Igreja em direção a conceitos e práticas divergentes da perspectiva evangélica, marcada pelo seguimento de Jesus Cristo, acolhimento do mistério da cruz e serviço humilde aos mais pobres. E tantas vozes se calaram ou deram razão ao fato de o Espírito Santo ter tomado de novo a palavra, tirando “da manga” a grande surpresa que tem sido o Papa. Discursos breves, centrados no essencial da mensagem cristã, gestos significativos, acolhimento, abraços, tudo apontando para a fidelidade a Jesus Cristo, proposta de bondade e ternura, braços abertos que expressam misericórdia e perdão.


Assista: O que você já aprendeu com o Papa Francisco?


A Igreja continua a mesma e sempre nova, capaz de se reformar com a chave da conversão que abre as portas dos corações. A novidade vem de dentro e não se conforma com a mentalidade corrente. A Igreja será sempre acompanhada pela provocação positiva da Carta dos Romanos: “Não vos conformeis com este mundo, mas transformai-vos, renovando vossa maneira de pensar e julgar, para que possais distinguir o que é da vontade de Deus, a saber, o que é bom, o que lhe agrada, o que é perfeito” (Rm 12,2). Papa Francisco é revolucionário, porque ama sem mudar uma vírgula que seja do Evangelho, do Catecismo ou do ensinamento moral da Igreja!

Já na Igreja primitiva, o crescimento dela acontecia quando passava por muitos sofrimentos e perseguições (Cf. At 14,21-27). Sua vida se caracterizava pelo anúncio da Palavra, testemunho da caridade e das ações maravilhosas do Senhor, orações e jejuns e atividade missionária. O apóstolo São Paulo empreendeu as grandes viagens, quando formava novas comunidades e constituía os servidores aos quais confiava estas mesmas agregações de cristãos. A Igreja suscitava a fraternidade e as pessoas nela se sentiam acolhidas e amadas. Dali para frente e até hoje, onde uma comunidade cristã se reúne na caridade, abre-se um oásis verdejante, onde as pessoas podem saciar sua sede de vida verdadeira.

A compreensão de comunidade para a fé cristã deriva da vida e dos ensinamentos de Jesus, assimilados pelos apóstolos e pelas primeiras comunidades. Na base da experiência comunitária, proposta por Jesus, está a experiência da “comunhão”. Jesus inicia seu ministério chamando discípulos para viverem com ele (cf. Mc 3,14). Todo o itinerário do discípulo, desde o chamado, é sempre vivido na comunhão com o Mestre, que se desdobra na comunhão com os outros. A dimensão comunitária é fundamental na Igreja, pois se inspira na própria Santíssima Trindade, a perfeita comunidade de amor. Sem comunidade, não há como viver autenticamente a experiência cristã. A dimensão comunitária da fé cristã conheceu diferentes formas de se concretizar historicamente, desde a Igreja Doméstica até chegar à paróquia na acepção atual (Cf. Tema central da 51ª Assembleia geral da CNBB, n.42-43), ou a proposta da paróquia como “comunidade de comunidades”, que tem sido encaminhada na maioria das dioceses do Brasil. Bem vivida, a dimensão comunitária da fé cristã transforma as pessoas e o mundo.

A fonte da novidade está no alto, lá no céu, na vida da Santíssima Trindade. Serão autênticas as comunidades cristãs e será confiável a vida de cada cristão quando refletirem a vida de Deus. De fato, quando Jesus abre a alma para anunciar o “seu” mandamento (Jo 13,31-35; Jo 15,12-17) não se limita a propor uma convivência pacífica e respeitosa entre as pessoas, mas quer que nos amemos uns aos outros “como” Ele nos amou. Não basta a benevolência ou, quem sabe, a filantropia, ou ainda o respeito à liberdade dos outros e às diferenças. Ele pede um pacto de amor mútuo, com pessoas dispostas a darem a vida uma pelas outras. Esta, sim, é a novidade, esta é a revolução para nosso mundo. Com este amor autêntico, vindo do céu, vem também a verdade, a justiça e todos os valores do Reino de Deus.

Homens e mulheres que fazem esta escolha são portadores de um tempo novo, em que Deus vem morar no meio do seu povo, para enxugar todas as lágrimas. Virá, sim, o tempo em que a morte não existirá mais e não haverá mais luto, nem choro, nem dor, porque terá passado o que havia antes (Cf. Ap 21,1-5). Quem aceitar dar o primeiro passo, nesta direção, não precisará esperar muito, pois verá, desde agora, florescer o jardim de Deus em torno de si. Basta começar, sem muitas palavras, com gestos simples e significativos, sem medo da ternura e da bondade, espalhando a misericórdia e o perdão.

Aquele que é o “homem novo”, que realiza as bem-aventuranças e atrai irresistivelmente as pessoas de todos os tempos, o que não deixa ninguém acomodado, este, sim, dirá: “Eis que faço novas todas as coisas” (Ap 21,5). Diante dele o Espírito e a Esposa, que é a Igreja, dizem: Vem, Senhor Jesus! Quem tem sede da novidade, venha, e quem quiser, receba de graça a água da vida! (Cf. Ap 22,17)