Você já sabe que amar é dar-se ao outro integralmente, gratuitamente para construí-lo. É a essência da vida a dois e o fermento que faz o casal crescer. Mas, para que você possa dar-se a alguém, livremente, você precisa possuir-se; ser senhor de si mesmo. As pessoas transformam o amor em egoísmo porque não tem o domínio de si mesma e não consegue dar-se, apenas tomar e receber.
A grande crise do mundo moderno é que ele dominou o macrocosmo das estrelas e o microcosmos da bactéria e dos átomos, mas perdeu o domínio de si mesmo. Não é mais homem! O senhor do mundo perdeu o controle de si mesmo e geme sufocado sob o peso daquilo que ele criou com a beleza de suas mãos e da sua inteligência. É um escravo da matéria que domesticou! Podemos dizer que há uma desintegração do homem porque ele permitiu que a matéria tomasse a primazia do espírito sobre sua vida.
As descobertas e invenções da moderna tecnologia nos deixam extasiados, seja no campo da informática, da biotecnologia, ou da medicina. No entanto, esse homem fantástico que dirige o universo, não consegue dirigir-se a si mesmo. Como conseqüência disso assistimos os tristes flagelos das guerras, da fome, da violência, etc…, que ainda pesam dolorosamente sobre tantos. Não há dúvida de que todos esses problemas teriam sido resolvidos se o homem tivesse o domínio sobre si mesmo e permitisse que o amor guiasse os seus passos.
Não falta comida para todos, não faltam recursos materiais e naturais para sanar os problemas atuais, o que falta é o homem devidamente construído; caminhando de pé, como Deus o fez. Como muito bem mostrou Michel Quoist, no seu belo livro Construir o homem e o mundo, o homem está escravizado pela própria matéria que ele domesticou, o seu espírito agoniza… O que será o homem sem a primazia do espírito?
Um escravo, escravizado pela própria tecnologia que desenvolveu.
Não é somente hoje que isto ocorre. Em proporções diferentes a história universal mostra que as civilizações caíram (Roma, Grécia, Bizâncio,…) muito mais pelo próprio apodrecimento interior do que por causa das invasões exteriores. O inimigo externo vence quando o interior está corroído em vista da agonia sob a matéria.
Todo progresso atual é belo e necessário, mas é preciso resgatar o homem como Deus o quis. Quanto maior for o sucesso do homem, mais a sua espiritualidade precisará crescer para não sucumbir ou se deixar cegar pelo brilho das suas descobertas.
O Papa João Paulo II numa de suas primeiras encíclicas: Redentor dos homens , mostrou bem claro que o homem teme exatamente aquilo que ele criou com o gênio da sua inteligência e das suas mãos; e que isto ocorre porque colocou a técnica sobre a ética e a matéria sobre o espírito. A conseqüência disso tudo foi dito acima, é a agonia do amor e a vitória do egoísmo e da morte.
Sem ser senhor de si mesmo você não consegue dar-se, não consegue amar. Só se consegue ser egoísta. É fácil constatar que hoje as piores doenças começam a ser do espírito, e não do corpo. Cresce o número de psiquiatras e psicólogos e alastra-se a depressão. São as conseqüências dos desequilíbrios de um mundo onde o amor agoniza, porque o homem abandonou Deus. Maravilhados com seus feitos, o homem se adora como o seu próprio deus, e por isso deixa-se esmagar pela matéria.
Eis a triste realidade hoje: o homem adora as coisas e a si mesmo no lugar de Deus, e inverte a escala dos valores. Então o amor morre. Para que você possa amar de verdade, como Deus quer, é preciso que você caminhe de pé , isto é, respeitando a primazia dos valores: em cima, o espírito; depois do racional; e abaixo do físico.
Se o teu corpo domina o teu espírito, então você caminha de cabeça para baixo.
Os três níveis são fundamentais para a vida, mas é imprescindível que a sua hierarquia seja respeitada, sob pena do homem se tornar um perigoso animal.
É o corpo que assume o comando quando a sensibilidade é satisfeita sem restrições, ou quando a satisfazemos com todos os prazeres da comida, da bebida, do sexo, que ele exige.
Você caminha de cabeça para baixo quando é o corpo que dá as ordens. Ai então vive-se como verdadeiro animal, apenas para comer, beber , dormir e gozar os prazeres do sexo. É o instinto que comanda, não a razão. Como uma pessoa dessa pode amar, como pode dar-se, renunciar a si mesmo, se o que importa é a satisfação do seu corpo?