Palavra do Bispo

O que viver nesta Quaresma?

O tempo da Quaresma é o convite a voltarmos os olhos para a Páscoa. Mas como viver bem este tempo?

Abre-se a porta da misericórdia! O Pai das Misericórdias enviou Seu Filho amado ao mundo e derramou sobre a humanidade a unção do Espírito Santo, para a festa do perdão, arte das artes, que tem na Trindade Santa sua fonte e realização, em benefício da humanidade. Abre-se a porta da Quaresma. Proclamamos, nesta semana, a necessidade da Penitência, com a Quarta-feira de Cinzas, pois, pelo doloroso mistério do pecado, pesa um sinal de condenação sobre a humanidade. Graças ao amor misericordioso de Deus não há pecado, por maior que seja, que não possa ser perdoado, nem pecador que seja posto de lado. Todas as pessoas que se arrependerem serão recebidas por Jesus Cristo com perdão e imenso amor. Diante de tamanha bondade, cabe-nos responder com a sinceridade da vivência quaresmal. O pregão bíblico da penitência, com o gesto da imposição das cinzas, vivido pela Igreja, quer ser o convite a que todos estejam dispostos a morrer para o homem velho.

O que viver nesta Quaresma-

A Igreja aprendeu e ensinou, no correr dos séculos, a importância do tempo, como oportunidade da graça de Deus, por meio do que chamamos Ano Litúrgico, com o qual percorremos o ciclo dos mistérios de Cristo, colhendo todos os presentes que são oferecidos. O tempo da Quaresma é o convite a voltarmos os olhos para a Páscoa, dedicando as próximas semanas à revisão de vida, prática da penitência, do sacramento da reconciliação, da leitura orante da Palavra de Deus, da participação na Eucaristia e no exercício da caridade.

A cada ano, a Igreja oferece temas e propostas de vida nova a todos os cristãos. O Papa Francisco desejou, neste ano de 2015, convidar-nos a refletir e mudar de atitude, na superação de um dos desafios mais urgentes, a globalização da indiferença.

Diz o Papa: “Dado que a indiferença para com o próximo e para com Deus é uma tentação real também para nós, cristãos, temos necessidade de ouvir, em cada Quaresma, o brado dos profetas que levantam a voz para nos despertar”. Depois de indicar passos a serem dados pela Igreja, pelas paróquias, comunidades e por todos os cristãos, considerados pessoalmente, assim convidou: “Para superar a indiferença e as nossas pretensões de onipotência, gostaria de pedir a todos para viverem este tempo de Quaresma como um percurso de formação do coração, a que nos convidava Bento XVI (Carta encíclica Deus caritas est, 31).

Ter um coração misericordioso não significa ter um coração débil. Quem quer ser misericordioso precisa de um coração forte, firme, fechado ao tentador, mas aberto a Deus; um coração que se deixe impregnar pelo Espírito e levar pelos caminhos do amor que conduzem aos irmãos e irmãs; no fundo, um coração pobre, isto é, que conhece as suas limitações e se gasta pelo outro. Por isso, amados irmãos e irmãs, nesta Quaresma, desejo rezar convosco a Cristo: ‘Fazei o nosso coração semelhante ao vosso’ (Súplica das Ladainhas ao Sagrado Coração de Jesus). Teremos assim um coração forte e misericordioso, vigilante e generoso, que não se deixa fechar em si mesmo nem cai na vertigem da globalização da indiferença”.

Também no Brasil acontece um intenso esforço de mudança de vida, com a Campanha da Fraternidade, realizada anualmente na Quaresma, desde 1964, com a qual deseja oferecer nossa contribuição à sociedade, para a construção de um mundo melhor. Em 2015, nossa Campanha é sobre “Fraternidade: Igreja e Sociedade”, com o lema “Eu vim para servir” (Cf. Mc 10, 45). O bonito cartaz da Campanha retrata o Papa Francisco lavando os pés de um fiel na Quinta-feira Santa de 2014. A Igreja atualiza o gesto de Jesus Cristo ao lavar os pés de seus discípulos. O lava-pés é expressão de amor capaz de levar a pessoa a entregar sua vida pelo outro.

A Igreja católica participa das alegrias e tristezas do povo brasileiro, e quer dar a sua contribuição, para que nosso povo seja mais disponível ao serviço das pessoas umas às outras. Queremos manter uma atitude de serviço, diálogo e cooperação. Queremos atuar em favor de tudo o que eleva a dignidade humana. Nossa colaboração quer ser ainda uma resposta ao convite do Papa para maior atenção aos pobres e sofredores, indo às periferias geográficas e existenciais, uma Igreja em saída, como diz o Papa Francisco.

Alguns temas serão tratados com intensidade e vão se transformar em prática dos cristãos, como fruto da Campanha da Fraternidade: a proteção dos direitos fundamentais das pessoas, o bem comum, a justiça social e o serviço da Igreja à sociedade. Desejamos procurar continuamente o que Deus quer de nós, discernindo nossas ações a partir do que existe em nossas comunidades, atuando por meio das pastorais sociais, dialogar com todas as forças da sociedade em vista do bem comum, introduzir cada vez mais o tema da paz e da superação da violência em nossas orações e nosso comportamento, acompanhar pessoas e famílias em situação de conflito, participar de forma consciente e construtiva no caminho do país para a reforma política.

Os cristãos não desejam privilégios, mas têm o direito de participar da vida da sociedade. Sabemos que existem posições contrárias à religião, numa sociedade que pretende cancelar as referências à transcendência e o reforço do individualismo. Há assuntos graves que pedem a participação de todas as forças da sociedade, como a educação, a saúde e a paz social. A Igreja tem uma palavra a dizer sobre esses temas e propõe modos de vida que não excluam pessoas e grupos da sociedade. Acolhendo o convite do Papa Francisco, em sua mensagem quaresmal, os católicos não se deixarão tomar pela globalização da indiferença. Saberão chorar com os que choram e rir com aqueles que riem (Cf. Texto-base da Campanha da Fraternidade 2015).

Começa uma “Campanha”, esforço intenso, durante a Quaresma, unindo forças humanas e corações iluminados pela fé. Uma Campanha “da Fraternidade”, sonhando alto e fazendo a nossa parte para que homens e mulheres de nosso tempo sejam mais fraternos. É uma Campanha da Igreja, que pretende ser “Campanha de Opinião Publica”, contribuindo para a elevação do nível de vida do povo brasileiro. O caminho está em Cristo, que veio “para servir”.


Dom Alberto Taveira Corrêa

Dom Alberto Taveira foi Reitor do Seminário Provincial Coração Eucarístico de Jesus em Belo Horizonte. Na Arquidiocese de Belo Horizonte foi ainda vigário Episcopal para a Pastoral e Professor de Liturgia na PUC-MG. Em Brasília, assumiu a coordenação do Vicariato Sul da Arquidiocese, além das diversas atividades de Bispo Auxiliar, entre outras. No dia 30 de dezembro de 2009, foi nomeado Arcebispo da Arquidiocese de Belém – PA.