Leproso

Não é fácil saber quantos foram os leprosos curados por Jesus. Sabemos que uma certa vez curou dez leprosos e os enviou para se mostrarem ao sacerdote do templo para que recebessem o certificado de que estavam curados. E um entre eles sentiu a necessidade de voltar atrás para agradecer a Jesus. E Jesus ficou meio decepcionado e triste por ver que a gratidão não era a virtude mais importante dos leprosos curados. E as palavras que ele pronunciou ficaram bem gravadas nos ouvidos dos discípulos. “Não eram por acaso dez os que foram curados? Os outros nove onde estão?”. Jesus não esperava agradecimento e nem recompensa pelo bem que ele fez, como também nós não devemos esperar isto, mas que ficamos felizes quando alguém se recorda de nos agradecer não há dúvida que ficamos.

As virtudes humanas, fortalecidas pela fé nos transformam em amor e solidariedade. Mas além destes dez leprosos curados por Jesus no evangelho há outros leprosos. Quero fazer referência ao texto do evangelista Marcos 1,40-45. O evangelista diz que um “leproso” se aproximou de Jesus… Este leproso não tem nome, mas diante do Senhor ninguém é anônimo, ele sempre nos ama como indivíduo. Não temos um nome, vivemos numa realidade concreta e nos sentimos cada vez mais anônimos, desencarnados da vida.

Na sociedade judaica e até entre nós, não faz muitos séculos a lepra era uma doença que marginalizava as pessoas. O medo do contágio relegava-os ao longe da sociedade e os afastava da vida. Eram mortos antes do tempo, excluídos da sociedade, e obrigados a tomar o caminho do deserto, não ter nenhum relacionamento com ninguém. Eram tratados como animais aos quais se coloca por compaixão um pouco de alimento para que não morram de fome, e nada mais. Eram obrigados a gritar para todos o próprio mal para que não sejam contaminados. O texto do Levítico nos relata numa forma crua e forte a situação dos leprosos (Lv.13,45). A vida não deve se aproximar da morte, a vida deve ser defendida mesmo que outra vida mais frágil seja prejudicada. A lepra, com o seu ataque destruidor à carne humana é sinônimo de morte, de contágio e de afastamento de tudo. Ela divide porque não é capaz de distinguir nada mais além do corpo que se desfaz.

Mas a vinda de Jesus trará algo de novo, a Boa Nova. Além do corpo corrompido que deve ser curado há uma boa nova que é possível perceber através do amor e do coração. Na ótica do amor ninguém pode ser excluído mas todos estão profundamente inseridos no corpo de Cristo e todos são ramos da videira que envia sua seiva para todos os ramos, não importa que um ramo seja mais forte ou menos forte do que o outro. É próprio do amor não excluir a ninguém. A exclusão de um único ser da nossa vida, seja qual for o motivo, não é evangélico e nem humano.

Jesus cura o leproso não com a palavra, mas o toca sem medo de se contaminar, é o sinal mais forte da passagem do homem velho para o homem novo. O toque de Jesus sempre nos purifica e nos infunde uma nova esperança. Precisamos gritar para todos, sim que somos pecadores mas especialmente para Jesus e pedir-lhe que, se ele quiser, pode nos transformar. Todo bem moral, físico, toda saúde espiritual ou do corpo é um dom de Deus, por isso nos é dado a graça de suplicar e de pedir. É apresentar-nos diante dele com nossa situação de fragilidade.

Vivemos numa sociedade que produz novas “lepras” que marginalizam e obrigam estes novos leprosos a gritarem o seu mal e a tomarem o caminho do deserto. A lepra das novas pobrezas que cada vez mais obrigam milhões de pessoas a recuar do centro da vida da sociedade e a tomar o caminho do deserto chamado favela, onde vivem uma vida degradante e debaixo do nível permitido a um ser humano. E todos os dias estes novos leprosos são como que obrigados a gritar a própria miséria para obter um prato de comida.

Os novos doentes que são afastados da sociedade e rejeitados como os “drogados” que a sociedade cria com seus mecanismos de lucro e de divisões, e depois abandona a si mesmos. Eles e elas que sentem na dependência química e perdem as motivações da vida, são irmãos e irmãs em busca de um Jesus que os cure e os ajude. Os doentes de AIDS que ainda trazem no corpo o sinal da marginalização, que buscam amor para poder viver na paz e na certeza de que são amados.

Todos nós trazemos no nosso corpo os sinais vivos da lepra do pecado. É preciso como o leproso bíblico de Marcos, não ter medo e avançar para Jesus, mesmo que sejamos rejeitados, e gritar com confiança: “se tu queres podes me curar”. E Cristo, comovido, se aproximará de nós e nos tocará, e seremos curados. A quem se decida a amar sabe que não pode excluir ninguém de sua vida, mesmo que o amor às vezes possa nos exigir a coragem de colocar em risco a nossa própria vida. Mas como esquecer as palavras de Jesus: “não há maior amor do que dar a vida por aquele que se ama”?